Caminhos para a bioeconomia amazônica

Como saberes tradicionais e a sociobioeconomia redefinem o futuro da região diante das pressões ambientais e sociais.

Resumo

A Amazônia combina riqueza biológica e diversidade cultural que, juntas, sustentam ecossistemas essenciais ao clima global. Povos indígenas e comunidades locais mantêm práticas que preservam florestas e garantem economias tradicionais. Após ciclos extrativistas desiguais, cresce a valorização da sociobiodiversidade. Nesse contexto, debates sobre bioeconomia apontam para modelos que integrem conservação, justiça social e desenvolvimento regional.

Introdução

A Amazônia está no imaginário coletivo pela imensidão dos seus rios, grandiosidade das suas florestas e riquíssima biodiversidade. Para além dessas singularidades, a ciência vem mostrando que ela tem um papel crítico na regulação do clima global, realizando trocas de água, energia e carbono entre o sistema terrestre e a atmosfera. Os processos ecológicos estão associados aos elementos da biodiversidade, que abriga grande proporção das espécies que existem nos trópicos, pelo menos 18% das espécies de plantas, 18% dos peixes e 14% das aves.[1]

Porém, o que poucos se davam conta até agora é que a biodiversidade amazônica foi mantida, ao longo dos séculos, pela diversidade cultural dos seus povos. Os modos de vida das comunidades indígenas e locais conseguem manter seus ecossistemas íntegros, extraindo recursos das suas florestas e dos rios. As áreas de agricultura ou roças são normalmente pequenas, com estratégias próprias de deixar a terra descansar e se regenerar, o que é chamado de pousio. Os produtos colhidos tradicionalmente na natureza são diversos e incluem frutas como açaí, castanha-do-Brasil (ou castanha-do-pará), peixes, fibras usadas em artesanatos e cestarias, e óleos medicinais como andiroba e copaíba, entre muitos outros.[2]

O látex (ou borracha), extraído da seringueira, representa o símbolo mais histórico do extrativismo amazônico que ganhou o mundo e segue ainda relevante em cadeias locais. Entretanto, ela não trouxe prosperidade duradoura à Amazônia. Embora tenha gerado riqueza momentânea durante o ciclo da borracha (final do século XIX e início do XX), essa riqueza ficou concentrada nas mãos de poucos — aviadores e exportadores — enquanto os seringueiros viviam em regime de endividamento, dependência e servidão por dívida. Este modelo extrativista e pouco sustentável era baseado na exploração intensiva de mão de obra, sem promover infraestrutura, educação ou diversificação econômica. A produção asiática mais competitiva de borracha levou ao colapso da economia amazônica. Assim, a extração deste produto simbólico gerou profundas desigualdades sociais e não gerou bases estruturais para o desenvolvimento regional.[3]

Após o declínio do ciclo da borracha, a economia amazônica manteve-se baseada em outras cadeias extrativistas, embora de forma mais fragmentada e restrita. A castanha-do-pará tornou-se uma das principais fontes de renda para seringueiros e comunidades tradicionais, enquanto produtos como óleos vegetais — de copaíba, andiroba, buriti e ucuúba — ganharam importância na indústria e na medicina popular. A extração de madeira expandiu-se a partir da segunda metade do século XX. Ao mesmo tempo, expandiu-se amplamente também a pecuária e finalmente a produção de monocultivos como soja. Essas transformações de usos da terra acompanharam grandes transformações socioambientais, com impactos significativos, como desmatamentos, degradação, perda de conectividade das paisagens e de coesão social.[2] (Figura 1)


Figura 1. A castanha-do-pará tornou-se uma das principais fontes de renda para comunidades tradicionais.
(Foto: WWF Brasil. Reprodução)

 

Mais recentemente, produtos naturais como o açaí, o cupuaçu e o babaçu consolidaram-se como bases da sociobiodiversidade amazônica, ligando o extrativismo à economia local e à valorização dos modos de vida tradicionais. A economia da sociobiodiversidade engloba uma ampla gama de produtos e benefícios sociais e ecológicos resultantes dos ecossistemas e dos sistemas de conhecimento e práticas de manejo dos Povos Indígenas e Comunidades Locais da Amazônia. A expansão desta economia é vista como uma alternativa poderosa para barrar a economia da destruição e promover uma nova era de prosperidade na região.[3]

 

“A biodiversidade amazônica foi mantida, ao longo dos séculos, pela diversidade cultural dos seus povos.”

 

Na última década, a “bioeconomia” começou a se difundir amplamente mundo afora e, na Amazônia, passou a englobar a chamada economia da sociobiodiversidade. Entretanto, o termo também abrange muitas outras cadeias, como a de biocombustíveis plantados em monocultivos. A bioeconomia emergiu em países industrializados, como resposta à necessidade de mitigação de emissões de gases de efeito estufa e transição energética. Ao se difundir na América Latina, no contexto de regiões ecologicamente sensíveis e socialmente vulneráveis, como no caso da Amazônia, surgiu a necessidade de integrar ao conceito princípios de conservação da biodiversidade e dos ecossistemas, equidade e justiça social.[4] Pensadores da região amazônica manifestaram a preocupação de que bioeconomia seria um termo amplo demais para se referir aos sistemas biodiversos amazônicos e assim identificaram a necessidade de distinguir esses diferentes modelos econômicos. Propôs-se então usar o conceito de “sociobioeconomia” como uma ramificação dentro da bioeconomia para se referir à economia da sociobiodiversidade.[5]

 

Da Bioeconomia à Sociobioeconomia: construindo a sustentabilidade na Amazônia

No documento “Reimaginando a bioeconomia para a Amazônia”, os autores enfatizam que a imensa biodiversidade da Amazônia e a presença de centenas de comunidades indígenas e tradicionais requerem a necessidade imperativa de abordagens localizadas para compreender a bioeconomia e capitalizar seu potencial.[6] Em entrevistas realizadas neste trabalho, muitos atores locais no Brasil revelaram a percepção de que o termo “bioeconomia” teria sido cooptado pelo “capitalismo verde” e assim não refletiria as atividades geradoras de renda que promovem o bem-estar dos povos da floresta com base nos seus conhecimentos tradicionais e coexistência harmoniosa com a natureza.

A mesma preocupação levou [5] a recomendar que “os valores principais de bioeconomia na Amazônia devem favorecer o fortalecimento de economias substantivamente enraizadas e compatíveis com um modelo de bioeconomia de floresta em pé e rios fluindo, com forte componente comunitário que valorize o conhecimento e os modos de vida das populações tradicionais”. A bioeconomia amazônica deve garantir princípios-chave, que incluem prescindir de desmatamentos, fortalecer as práticas culturais e econômicas milenares das comunidades tradicionais e locais, valorização da biodiversidade e garantir a distribuição equitativa dos benefícios com as comunidades locais.[7]

Dessa forma, pode-se observar que há uma convergência de visões sobre a bioeconomia na realidade amazônica, na qual a sociobioeconomia deve ser o eixo central da vocação da região, na qual a proteção e garantia dos territórios indígenas e de comunidades tradicionais torna-se um compromisso ético-normativo para desenvolver uma bioeconomia que seja inclusiva, além da necessidade de integração entre conhecimentos tradicionais e científicos.[8]

 

O que é a sociobioeconomia amazônica?

A sociobioeconomia na região inclui uma ampla gama de atividades que mantêm a diversidade cultural e as paisagens multifuncionais produtivas e conservadas, ao mesmo tempo em que promovem valor econômico e social agregado à biodiversidade e à agrobiodiversidade da Amazônia.[9] Isto inclui o fornecimento de inúmeros serviços ecossistêmicos por meio da conservação e da restauração de ecossistemas terrestres e aquáticos, assim como através da produção e do processamento diversificado de plantas nativas (frutas, nozes, remédios) e peixes, entre outros. As atividades da sociobioeconomia geram alto valor agregado, enquanto protegem os ecossistemas nativos e são compatíveis com os meios de vida das populações indígenas, tradicionais e locais. Eles são baseados em espécies e ecossistemas nativos ou sob manejo sustentável, como as agroflorestas biodiversas e sistemas tradicionais. Em geral, tais sistemas não implicam em desmatamentos, degradação ou poluição dos ecossistemas locais.[9]

 

“Os sistemas produtivos da sociobioeconomia são apoiados na produção familiar ou nas comunidades.”

 

Os sistemas produtivos da sociobioeconomia são apoiados na produção familiar ou nas comunidades. Eles são baseados no uso de produtos florestais e pesqueiros diversos, assim como na ampla gama de sistemas agroflorestais tradicionais sendo os sistemas de produção mais antigos na Amazônia, e incorporam muitas dimensões da definição de sociobioeconomia. Esses sistemas geram alto valor com impactos ambientais baixos ou até mesmo positivos ao aproveitar a biodiversidade e os recursos genéticos únicos da região.[9]

 

O que está incluído na sociobioeconomia [9, 10] (Figura 2)


Figura 2. As atividades de bioeconomia geram alto valor da sociobiodiversidade da Amazônia, ao mesmo tempo que protegem os ecossistemas nativos e são compatíveis com os meios de subsistência indígenas. São espécies nativas do bioma Amazônia, cultivadas em matas nativas e agroflorestas. As atividades que degradam o ecossistema local e a saúde planetária através do desmatamento, da poluição e da degradação não se enquadram na bioeconomia.
(Fonte: Garrett et al. 2024 [9])

 

– Conservação de ecossistemas nativos para mercados de serviços ecossistêmicos (e.g. carbono, biodiversidade e água).

– Cultivo e extração de frutas nativas (e.g. castanha-do-brasil, açaí).

– Cultivo de frutas e outros produtos em agroflorestas.

– Cultivo e extração de plantas medicinais.

– Pesca e aquicultura sustentável.

 

O que não está incluído na sociobioeconomia

– Extração de combustíveis fósseis.

– Desmatamentos.

– Extração insustentável de madeira e produtos não-madeireiros.

– Pecuária e monocultivos.

– Sobrepesca.

– Mineração.

 

 

Exemplos de sistemas da sociobioeconomia amazônica [11]

Co-manejo de Pirarucu em Reservas de Desenvolvimento Sustentável no Amazonas

O pirarucu, o maior peixe de escamas de água doce do mundo, estava severamente ameaçado há uma década. O seu alto valor comercial e importância nas dietas locais levaram à pesca insustentável e diminuição dos estoques pesqueiros.

Em áreas protegidas do rio Juruá, foram estabelecidos acordos de pesca comunitários entre pescadores, apoiados por Organizações Não Governamentais locais. O trabalho, em territórios coletivos protegidos de planícies alagáveis, envolve o monitoramento populacional pelas próprias comunidades usando contagens visuais diretas dos peixes nos rios e lagos. O pirarucu vem à superfície da água para respirar e assim sua população pode ser estimada observando o número de vezes em que ele sobe à superfície.

A combinação do controle da pesca, monitoramento dos estoques e a adoção de medidas de proteção permitiu conciliar o desenvolvimento econômico das famílias com a preservação dos ecossistemas aquáticos e a manutenção das comunidades tradicionais que dependem desse recurso natural. Foram estabelecidas épocas específicas nas quais a pesca do pirarucu é permitida para a espécie ter tempo suficiente para se reproduzir e manter seu estoque populacional saudável.

 

“As sociobioeconomias representam hoje uma das principais esperanças para uma transição a modelos de desenvolvimento mais justos e prósperos de enfrentamento aos problemas socioambientais que enfrentamos.”

 

A população do pirarucu foi recuperada, com um aumento estimado de 425%. Instituições comunitárias foram criadas e fortalecidas, com milhares de famílias sendo beneficiadas em 28 territórios, o que gerou renda e bem-estar social para as comunidades locais, incluindo o engajamento de mulheres e jovens.

 

Agroflorestas em Tomé-Açu no Pará [3]

Em Tomé-Açu, no Pará, as práticas agroflorestais surgiram no final da década de 1960 como resposta à crise das monoculturas de pimenta-do-reino, afetadas por doenças e preços baixos. A solução encontrada pelos agricultores foi diversificar a produção, originando o Sistema Agroflorestal de Tomé-Açu (SAFTA), baseado na integração de espécies agrícolas e florestais. Essa inovação transformou a região em um polo de exportação de produtos com alto valor agregado, especialmente para o Japão e os Estados Unidos, e em um exemplo de referência nacional e internacional em agrofloresta. A Cooperativa Agrícola Mista de Tomé-Açu (CAMTA), criada a partir de uma organização dos imigrantes japoneses fundadores da colônia em 1929, conta hoje com mais de 170 cooperados e 1.800 agricultores familiares, gerando cerca de 10 mil empregos diretos e indiretos. Entre os principais produtos estão pimenta-do-reino, cacau, óleos vegetais e polpas de frutas regionais. Os SAFTAs combinam espécies exóticas e nativas, como cacau, cupuaçu, açaí, taperebá, castanha-do-pará e madeiras nobres, promovendo sustentabilidade econômica e ambiental. O cooperativismo e o trabalho coletivo sempre foram pilares do desenvolvimento local, contrastando com relações assimétricas e clientelistas comuns em outras partes da Amazônia. A experiência demonstra a importância de fortalecer a cooperação, a agrofloresta biodiversa e a ampliação dos mercados para consolidar modelos de produção sustentáveis e socialmente inclusivos na região amazônica.

 

A bioeconomia que não se quer para a Amazônia

Diversos autores identificam riscos potenciais caso a bioeconomia não se desenvolva de forma sustentável. Por exemplo, a produção de açaí — o produto mais proeminente da região e o primeiro a ultrapassar um valor de mercado de US$ 1 bilhão — pode promover a conservação e o empoderamento local quando manejado dentro de florestas biodiversas. No entanto, a rápida expansão e intensificação do manejo e do cultivo também têm levado à perda da biodiversidade e à vulnerabilidade social com as mudanças climáticas.

Os diversos riscos (Lopes et al. 2023) podem ser categorizados em cinco tipos principais:

 

(1) Riscos de Injustiça Social e Territorial que envolvem a reprodução de desigualdades históricas e novas formas de exclusão socioeconômica no contexto da bioeconomia. Eles podem se propagar, por exemplo, a partir do interesse de grandes empresas em territórios coletivos, que pode acirrar conflitos territoriais e gerar apropriação de benefícios, levando movimentos sociais e instituições da sociedade civil a adotar postura de cautela (Carta da Amazônia, 2021). A corrida para apropriação de terras para investimento e acumulação de capital, também conhecido como “Land-grabbing”, pode resultar em expropriação de comunidades, conflitos e danos ambientais. A falta ou pouca participação e controle social, com ausência de processos participativos legítimos e de mecanismos de governança que assegurem o protagonismo das populações locais.

(2) Riscos de Governança e Institucionais que se relacionam à ausência de coordenação entre atores e políticas, e à fragilidade de instituições locais em assegurar equidade e sustentabilidade nas cadeias da bioeconomia. Insuficiente governança e cooperação entre atores, que inclui a fragmentação institucional e baixa integração entre políticas, programas e níveis de governo. Envolvem ainda distorções no uso de instrumentos e incentivos inovadores — mecanismos como mercado de carbono, Pagamento por Serviços Ambientais (PSA) e cadeias de alto valor (ex.: gastronomia gourmet) podem gerar assimetrias, especulação e exploração das comunidades locais. Modelos de exploração inadequados — replicação de modelos de desenvolvimento centrados na extração de insumos, sem agregar valor local ou respeitar a diversidade de dinâmicas amazônicas.

(3) Riscos Econômicos e de Mercado que abrangem efeitos negativos decorrentes do crescimento da demanda global e da estrutura desigual das cadeias produtivas. Ele ocorre, por exemplo, pelo aumento de demanda por produtos amazônicos, que pode gerar escassez local e encarecimento, afetando a segurança alimentar e nutricional das comunidades. Outra questão relevante é a potencial bioprospecção de insumos com repartição desigual de benefícios, na qual a exploração de recursos genéticos e conhecimentos tradicionais ocorre sem retorno justo para populações locais.

(4) Riscos Ambientais e de Intensificação Produtiva relacionados à pressão sobre ecossistemas e à degradação associada ao manejo inadequado. Um caso emblemático é a intensificação da produção agroflorestal sem governança adequada, com práticas predatórias como o adensamento de açaizeiros (processo conhecido como “açaização”) ou a expansão de monocultivos de dendê que podem reduzir a diversidade, aumentar a vulnerabilidade ecológica e precarizar o trabalho comunitário.

(5) Riscos de Ilegalidades e Violências a partir da atuação de redes criminosas e na fragilidade do Estado em garantir segurança territorial e ambiental. Ilegalidades e violências associadas ao crime organizado, especialmente ligadas ao mercado ilegal de terras e madeira, afetando a dinâmica e a reputação das cadeias produtivas no bioma.

 

A travessia rumo ao florescimento das sociobioeconomias

Em tempos de crise climática, ameaças à biodiversidade e riscos de perdas irreversíveis à sociedade, especialmente povos indígenas e comunidades locais, novos modelos de desenvolvimento são urgentemente necessários para a Amazônia. As sociobioeconomias representam hoje uma das principais esperanças para uma transição a modelos de desenvolvimento mais justos e prósperos de enfrentamento aos problemas socioambientais que enfrentamos.

Os modelos inovadores de desenvolvimento econômico devem contar com sistemas de produção multifuncionais que garantam a biodiversidade local e a conectividade ecológica e social, incluindo florestas nativas, manejo de florestas e ecossistemas aquáticos, turismo e sistemas agrícolas sem grandes impactos ambientais.[2] A transição para estes modelos inovadores, entretanto, depende de uma série de mudanças estruturantes profundas a serem feitas na região, que garantam a transformação da economia de destruição para uma economia do conhecimento baseada na natureza.

Entre as principais mudanças incluem-se transformações na infraestrutura para estimular mercados promissores para os produtos de sociobiodiversidade e reduzir a dependência de intermediários que participam das cadeias de comercialização. A facilitação da mobilidade das populações rurais e seu acesso a serviços urbanos por meio de sistemas de informação, transporte fluvial, internet de alta qualidade e oferta de intercâmbios, formações e treinamentos. Além disso, as cidades têm papel importante em fortalecer os mercados onde os agricultores familiares atuam por meio de cooperativas focadas na industrialização do que já produzem.[3]

Acima de tudo, o florescimento das sociobioeconomias depende de interromper as atividades que ameaçam as sociobioeconomias e as comunidades que as sustentam, garantindo salvaguardas contra a bioeconomia que não se quer para a região. Ele depende ainda do pleno direito e acesso à terra e aos recursos naturais dessas comunidades, bem como garantir a demarcação de terras e a proteção dos territórios. Isto é importante uma vez que estas comunidades usam recursos de forma comum e compartilhada, como pesca, produtos florestais madeireiros e não madeireiros. O desenho e implementação de processos de planejamento de forma transparente e participativa, baseado nos sistemas de conhecimento das comunidades indígenas e locais e na integração com conhecimentos científicos onde houver demandas.[2, 9]

É importante reconhecer que existe uma diversidade de contextos na Amazônia, para além das regiões de florestas e sistemas aquáticos conservados. No arco do desmatamento, existem extensas áreas abertas e alguns remanescentes florestais degradados pela exploração madeireira, incêndios florestais e efeitos de borda. As agendas de desenvolvimento para a bioeconomia devem ser adaptadas para cada contexto. Porém, é importante reforçar que a sociobioeconomia deve ser a ramificação da bioeconomia mais incentivada nas áreas florestadas e nas demais áreas onde as florestas necessitam ser restauradas.

Finalmente, deve-se considerar que as próprias mudanças climáticas, com aumento de extremos de temperaturas e incêndios florestais, ameaçam as atividades da sociobioeconomia amazônica. A grande seca de 2023, por exemplo, impactou a cadeia produtiva do pirarucu no Juruá. A diminuição do nível dos lagos e dos rios e a dificuldade de acesso aos ambientes de pesca impossibilitaram muitas comunidades de pescar. A cadeia do açaí também é fortemente impactada no período de secas, com redução na produção dos frutos. A mitigação e adaptação das mudanças climáticas são cruciais para garantir que as próprias soluções para as crises globais tenham chance de produzir seus efeitos.

 

Capa. Produtos naturais como o açaí, o cupuaçu e o babaçu consolidaram-se como bases da sociobiodiversidade amazônica.
(Fonte: WWF Brasil. Reprodução)

 

Ciência & Cultura © 2022 by SBPC is licensed under CC BY-SA 4.0  
[1] ZAPATA-RÍOS, G. et al. Capítulo 3: Diversidade biológica e redes ecológicas na Amazônia. In: NOBRE, C. et al. (Eds.). Relatório de Avaliação da Amazônia 2021. Trad. Jens Munck. Nova Iorque: Rede de Soluções para o Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas, 2021. Disponível em: https://www.aamazoniaquequeremos.org/pca-publicacoes/. DOI: 10.55161/SNFD8916.
[2] FERREIRA, J. et al. Capítulo 6: Promoção da conectividade em cenários de produção: apoiando sistemas multifuncionais para a biodiversidade e o bem-estar. In: PEÑA CLAROS, M.; NOBRE, C. A. et al. (Eds.). Assessment Report 2025: [título a confirmar]. New York: Science Panel for the Amazon, SDSN, 2025. DOI: 10.55161/HPUL7554.
[3] ABRAMOVAY, R. et al. The new bioeconomy in the Amazon: opportunities and challenges for a healthy standing forest and flowing rivers. In: NOBRE, C. et al. (Eds.). Amazon Assessment Report 2021. New York: United Nations Sustainable Development Solutions Network, 2021. Disponível em: https://www.theamazonwewant.org/spa-reports/. DOI: 10.55161/UGHK1968.
[4] RODRÍGUEZ, A. G.; RODRIGUES, M.; SOTOMAYOR, O. Towards a sustainable bioeconomy in Latin America and the Caribbean: elements for a regional vision. Santiago: Economic Commission for Latin America and the Caribbean (ECLAC), 2019. (Natural Resources and Development series, n. 193). Disponível em: https://repositorio.cepal.org/.
[5] COSTA, F. et al. Uma bioeconomia inovadora para a Amazônia: conceitos, limites e tendências para uma definição apropriada ao bioma floresta tropical. São Paulo: WRI Brasil, [s.d.]. (Texto para discussão). Disponível em: https://wribrasil.org.br/pt/publicacoes.
[6] LESENFANTS, Y. et al. Re-imagining bioeconomy for Amazonia. Washington, D.C.: Inter-American Development Bank, 2024. (IDB Technical Note).
[7] BERGAMO, et al. The Amazon bioeconomy: Beyond the use of forest products. Ecological Economics, v. 107448, 2022. DOI: 10.1016/j.ecolecon.2022.107448.
[8] LOPES, D. B. et al. Visões sobre bioeconomia na Amazônia: oportunidades e desafios para a atuação da Embrapa. Brasília, DF: Embrapa, 2023.
[9] GARRETT, R. et al. Apoiando sociobioeconomias de saudáveis florestas em pé e rios fluindo na Amazônia. Policy brief, 2023. Disponível em: https://por-policy-briefs.sp-amazon.org/230805%20Bioeconomy%20PB_Final%20(Portuguese).pdf.
[10] FERREIRA, J. et al. A lack of clarity on the bioeconomy concept might be harmful for Amazonian ecosystems and its people. Ecological Economics, v. 224, 2024.
[11] CAMPOS-SILVA, J. V. Chamada à ação 20: Expandir a cogestão da pesca para transformar as estruturas de conhecimento e governança nos sistemas de produção amazônicos. In: Relatório de Avaliação da Amazônia 2025 – Conectividade da Amazônia para um Planeta Vivo. New York: Sustainable Development Solutions Network, 2025. Disponível em: www.sp-amazon.org/publications. DOI: 10.55161/YXVD926.
Joice Ferreira é ecóloga e pesquisadora da Embrapa Amazônia Oriental. Também é professora do Programa de Pós-Graduação em Ciências Ambientais e do Programa de Pós-Graduação em Ecologia na Universidade Federal do Pará (UFPA).

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