De espada empunhada e montado em seu cavalo, D. Pedro heroicamente bradou “independência ou morte!” e declarou o Brasil separado de Portugal. Embora não tenha acontecido exatamente como retratou Pedro Américo, o fato é que no imaginário de muitos brasileiros a independência do país está associada à sua pintura “O Grito do Ipiranga”. Atualmente, a obra está sendo restaurada por especialistas da USP nas áreas de física e química. A restauração integra o projeto de reforma do Museu do Ipiranga e o objetivo é entrega-la como parte das comemorações do Bicentenário da Independência.
Cercada por contradições, com seus personagens e ambientação idealizados, a pintura tornou-se uma espécie de retrato oficial da nacionalidade, sendo considerada a representação mais consagrada e difundida do momento da independência do Brasil. A obra foi encomendada em 1886 pela Família Imperial, com a ideia de ressaltar o poder monárquico do recém-instaurado império. Foi pintada por Américo em um estúdio em Florença, na Itália, e concluída em 1888, quando embarcou para o Brasil. Porém, só foi exposta pela primeira vez em 7 de setembro de 1895, na inauguração do Museu do Ipiranga, tornando-se uma de suas principais atrações. Medindo 415 x 760 cm, a pintura é bem maior que as portas e janelas do museu, e após ter sido montada nunca mais foi retirada de seu lugar.
Uma equipe de nove profissionais, sob o comando da especialista em restauro do Museu do Ipiranga Yara Petrella, vem trabalhando na restauração da pintura desde 2017. O objetivo é reparar danos causados pela ação do tempo e também devolver à pintura suas cores originais.
Ciência & arte
O trabalho de restauração é um trabalho minucioso. O primeiro passo foi realizar um levantamento de documentos sobre a pintura para obter detalhes sobre suas cores originais. Após essa primeira etapa, foi feita a reflectografia em infravermelho, para permitir a visualização dos traços iniciais de Pedro Américo, recobertos posteriormente com camadas de tinta. Depois, a obra passou por uma espectroscopia por fluorescência de raios-X, que possibilita determinar a paleta de cores, sugerindo os pigmentos usados originalmente pelo artista. Os restauradores ainda utilizaram a microscopia Raman para identificar elementos químicos que possam estar presentes em mais de um pigmento.
Apenas todas essas etapas é que foi inciada a restauração, quando a equipe de restauradores utilizou todo o conhecimento acumulado sobre a obra nas fases anteriores para aplicar uma nova camada de tinta sobre a tela, respeitando seu aspecto, materiais e técnicas originais. A última fase é a de envernizamento, quando o quadro é recoberto com verniz, que resiste a muitos anos sem amarelecer. Quando o Museu do Ipiranga for reaberto, essas e outras informações estarão disponíveis visualmente e através de um sistema multimídia.