Um século atrás, cientistas criaram a primeira rádio brasileira voltada para a educação, a cultura e a ciência
Em 23 de abril de 1923 nasceu a Rádio Sociedade do Rio de Janeiro (hoje Rádio MEC), rádio pioneira no Brasil (Figura 1). Não foi uma ação de governo. Foi criada por um movimento de cientistas e intelectuais, articulado pela Academia Brasileira de Ciências (ABC). A Rádio Sociedade (RS) tinha como objetivo educar e divulgar a ciência, a arte e a cultura.
Figura 1. Instalação da Rádio Sociedade no Rio de Janeiro
(Reprodução)
Seu primeiro presidente foi Henrique Morize e o secretário-geral era Edgard Roquette-Pinto, ambos na direção da ABC (Figura 2).
Figura 2. Diretores e alguns sócios da RS
(Reprodução)
A rádio foi criada nas salas da Escola Politécnica (atual prédio do Instituto de Filosofia e Ciências Sociais – IFCS) e transferida, pouco depois, para o Pavilhão Tcheco na Avenida das Nações, que havia sido cedido à ABC (Figura 3).
Figura 3. A nova estação da RS
(Reprodução)
Diziam seus estatutos: “A Rádio Sociedade, fundada com fins exclusivamente científicos, técnicos, artísticos e de pura educação popular, não se envolverá jamais em nenhum assunto de natureza profissional, industrial, comercial ou político”. Roquette-Pinto foi o principal motor da criação e na manutenção da RS, além de se desdobrar como locutor dos primeiros programas de notícias com seu vozeirão característico, que ficou marcado na memória de muitos ouvintes. Ele acalentava muitas esperanças sobre o papel que o rádio poderia desempenhar na educação brasileira: “Rádio é o jornal de quem não sabe ler; é o mestre de quem não pode ir à escola; […] o guia dos sãos, desde que realizado com espírito altruísta e elevado”. Aulas e palestras sobre assuntos variados, como física, química, botânica, história natural, literatura, educação para crianças, etc., eram transmitidos pela RS, que atingia cerca de 150.000 ouvintes três anos após a sua criação.
A RS valorizava a música clássica e tinha sua própria orquestra sinfônica. Pelos seus microfones passaram muitas personalidades da cultura, da arte e da ciência, como Albert Einstein, que visitou a ABC em 1925, e a RS e fez nela uma alocução na qual defendeu a importância do rádio para a disseminação da cultura e da ciência (Figura 4).
Figura 4. Visita de Albert Einstein à Academia Brasileira de Ciências (ABC)
Reprodução
Einstein ouviu músicas brasileiras tocadas pela orquestra da RS (Figura 5), como o tango Magnífico, de Ernesto Nazareth, e Batuque, de Alberto Nepomuceno, mas se encantou mesmo foi com o maxixe Mulatinho, de Belmácio Godinho. Em 1926, as aulas de Marie Curie sobre radioatividade, na Escola Politécnica, foram também transmitidas.
Figura 5. Notícia sobre a visita de Albert Einstein à instalação da RS
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A RS criou duas revistas de divulgação científica (Figura 6). Radio, revista de divulgação científica geral, mas orientada para a rádio-cultura, foi criada em 1923 e era órgão oficial da Rádio Sociedade. Electron foi criada em 1926 e era uma publicação bimensal, distribuída aos seus sócios, com tiragem de três mil exemplares, e trazia também a programação da rádio.
Figura 6. Revistas de divulgação científica Rádio e Electron, criadas pela RS
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Em setembro de 1936, sem condições de aumentar a potência da sua estação – conforme exigia o governo – a RS resolveu encerrar suas atividades. Ela foi doada para o Governo Federal (Ministério da Educação – MEC) com a condição que permanecesse uma rádio educativa e sem interesses comerciais. Transformou-se na Rádio MEC. Em 2023 teremos o centenário da criação da Rádio Sociedade do Rio de Janeiro. Será importante organizar atividades comemorativas à altura da relevância do acontecimento para a cultura, a educação e a ciência brasileiras.
Mais informações sobre a história da Rádio Sociedade, sua programação, a interação com os ouvintes, as revistas que gerou e o impacto que teve em:
http://www.fiocruz.br/radiosociedade/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm?tpl=home
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