Produzido pela Univale TV, vídeo alerta para a necessidade urgente de conservação do bioma
O documentário “Mata Atlântica: bioma biodiverso do Brasil” revela a exuberância e a necessidade urgente de preservação do segundo bioma mais ameaçado de extinção. O trabalho foi produzido pela UNIVALE TV, em parceria com a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) para a edição da Ciência & Cultura sobre “Biomas do Brasil”. Com roteiro e direção da repórter Liliane Ambrósio Guedes, edição de Carlos Farias e imagens dos cinegrafistas Alex Quirino, Danyel Guimarães, Josias Guilherme dos Reis e Romilson Gonçalves, a equipe de jornalismo da UNIVALE TV percorreu 300 quilômetros no Médio Rio Doce, do Vale do Aço a Aimorés, exibindo belezas naturais, a relação dos povos remanescentes com o meio ambiente, projetos de reflorestamento e desafios de reservas importantes na região.
O material faz parte da série Biomas do Brasil (da revista Ciência & Cultura, da SBPC), traz imagens inéditas sobre a Mata Atlântica no Médio Rio Doce e conta com um olhar criterioso de pesquisadores do mestrado em Gestão Integrada do Território da UNIVALE (GIT), e também de outras instituições. Entre eles, o doutor em Ciências e Ecologia da Universidade Federal de São Carlos (UFSCAR) e coordenador de um grupo de pesquisas ambientais na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Francisco Barbosa, que falou sobre a riqueza da biodiversidade no Médio Rio Doce. “Nós estamos falando em 77 espécies de mamíferos, das 260 conhecidas da Mata Atlântica, além de 325 espécies de aves e 22 espécies de peixes, isso é quase 30% da bacia. E de plantas nós temos mais de 1.000 espécies, das 20 mil espécies conhecidas da Mata Atlântica”, destacou Francisco.
Essa biodiversidade, pontua o pesquisador, está ameaçada por fatores que incluem desmatamento, mineração, introdução de espécies exóticas, processo de urbanização, caça e pesca predatória, tráfego ilegal de espécies e turismo não regulamentado.
O impacto da siderurgia
A chegada de usinas siderúrgicas também provocou grande impacto ambiental, como lembra Lenício Dutra Júnior, que é professor de História no campus de Governador Valadares do Instituto Federal de Minas Gerais (IFMG) e doutor em Ciências Humanas pelo Doutorado Interinstitucional (Dinter) da UNIVALE em parceria com a Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Ele estima que o consumo de madeira para produção de carvão vegetal na região era de 25% – um número muito acima da média nacional, de 3%.
“Isso tudo em função da necessidade de alimentar os altos-fornos e a fabricação de ferro-gusa e aço. Por isso, a gente pode dizer que a Mata Atlântica foi decisiva para o desenvolvimento do Vale do Rio Doce e para o desenvolvimento do Vale do Aço, especialmente para se transformar em um polo siderúrgico, como se transformou ainda hoje. A floresta serviu muito bem a esse propósito. Por outro lado, a gente tem o impacto ambiental pela ausência da vegetação, porque a partir da derrubada da floresta a gente tem outras atividades econômicas, como a pecuária e a agricultura, que vão substituir a floresta, e muitas vezes sem o devido cuidado. Por isso a gente tem hoje, na região do Médio Rio Doce, grandes problemas ambientais evidentes”, observa Lenício.
Coordenador do mestrado da UNIVALE, o professor Haruf Salmen Espíndola acrescenta que todos esses processos de exploração econômica da Mata Atlântica – que incluíam, ainda, a construção da ferrovia, para extração e exportação de minério de ferro – aceleraram o processo de ocupação do Médio Rio Doce na primeira metade do século 20. “Esse processo se intensifica ainda mais nos anos 40 e 50, e isso faz com que a região seja um retrato do que se chama de grande aceleração”, disse Haruf, que também integra o Observatório Interdisciplinar do Território (Obit), ligado ao GIT e que desenvolve projetos na linha da relação território e ambiente.
O Obit presta assessoria ao Fórum Permanente da Bacia do Rio Doce e realiza pesquisas, e a biodiversidade da região é também tema de estudo. Docente no mestrado da UNIVALE e pesquisadora no Obit, a professora Renata Campos é orientadora de um trabalho sobre o Parque Estadual do Rio Doce (Perd), onde a Mata Atlântica está presente.
“O entendimento é que para conservar a biodiversidade que está ali, e todo aquele ecossistema, não basta pesquisar sobre os organismos que estão situados ali dentro daquele espaço. Mas é preciso pensar também no Parque enquanto um território, onde há disputas de poder, onde há disputas de interesse. E a gente tenta contribuir para esses processos voltados para a gestão, buscando entender como que a população do entorno se relaciona com o Perd, como que a população do entorno entende o Perd”, explicou Renata. “O objetivo desse projeto é avaliar o desenvolvimento de pesquisas sobre biodiversidade dentro do Parque, para compreender quais as necessidades do Perd quanto a pesquisa em relação a determinados períodos do ano”, acrescentou o estudante de Medicina Veterinária da UNIVALE, Henrique Rocha Fonseca, que participa do estudo.
Parque Estadual do Rio Doce
Embora ameaçado, ainda há lugares onde o bioma da Mata Atlântica é preservado na região. Um desses locais é o Perd, unidade de conservação com quase 36 mil hectares, abrangendo os municípios de Dionísio, Marliéria e Timóteo, todos no Vale do Aço. Gerente do Parque, Vinícius de Assis afirma que o local abriga e preserva espécies únicas e exclusivas de fauna e flora nativas da Mata Atlântica, além do terceiro maior complexo de lagos e planícies alagadas do Brasil – atrás apenas da Amazônia e do Pantanal.
“Isso é muito importante, coloca o parque numa categoria importantíssima de preservação dos ambientes úmidos brasileiros e mundiais. Precisamos refazer essa ligação entre homem e natureza. E a grande oportunidade é com a Mata Atlântica. Ela que produz água, serviços ambientais e ecossistêmicos prestados cotidianamente para a gente. Respiramos o ar que ela produz”, salientou Vinícius.
Instituto Terra
Outro trabalho de preservação da Mata Atlântica no Médio Rio Doce é o reflorestamento promovido pelo Instituto Terra, em Aimorés, idealizado em 1998 pelo fotógrafo Sebastião Salgado. “A ideia do Instituto foi evoluindo, começou com o questionamento sobre o que fazer com esta terra, que meus pais herdaram do meu avô. Era uma fazenda de gado, estava totalmente devastada. Naquele ano que meu avô passou a fazenda para frente, ele plantou capim para o gado dele, e o capim não cresceu. Esse é o estado em que esta terra estava, estava esgotada. Exaurida, parecia um deserto para quem andava aqui. E eles [os pais de Juliano, Sebastião e Lélia Salgado] realmente não sabiam o que fazer. O Sebastião e a Lélia mexiam com fotografia, e a Lélia teve essa ideia simples, porém bem complicada: e se a gente replantasse a floresta que tinha aqui?”, recorda o filho de Sebastião e atual presidente do Instituto Terra, o cineasta Juliano Salgado.
Em 25 anos, foram mais de 3 milhões de árvores plantadas em uma área de 700 hectares, onde se encontram mais de 300 espécies nativas da região, preservando a biodiversidade. “A gente vê o sucesso desse plantio através da fauna, que voltou. A gente encontra aqui os grandes predadores, que estão no topo da pirâmide alimentar, como onças. Tem uma família de cinco onças aqui, além de grandes macacos, lobos, e toda a biodiversidade que você pode imaginar. Da minhoquinha até a onça. As pessoas em volta da gente não entendiam porque a gente estava fazendo isso. Não viam a razão de replantar uma floresta em uma fazenda que eles consideravam produtiva. A primeira pessoa que duvidava disso era meu avô, ele tinha 96 anos e achava que era um desperdício de dinheiro. E ninguém aqui acreditava”, frisa Juliano.
O Instituto também fornece assistência técnica a produtores rurais, ensinando técnicas sustentáveis e de recuperação ecológica que podem ser replicadas em fazendas. “Além de restaurar a paisagem, a restauração das nascentes é algo que nós trabalhamos aqui no Instituto Terra que tem um papel fundamental. Muitos sítios e propriedades também tiveram perdas de água no interior delas, e isso hoje tornou-se um legado de a gente ir a esses lugares e trabalhar com a restauração, conscientizando o produtor que é necessário fazer um trabalho ali, não somente de plantar árvores no entorno, mas de proteger aquele ambiente para que a água continue aflorando naquele ponto. E dê rentabilidade para o produtor. Uma propriedade sem água perde seu valor econômico e até mesmo a perspectiva de produção”, destaca o engenheiro ambiental do Instituto Terra, Moisés Marcelino.
Oito anos de lama
O documentário “Mata Atlântica: bioma biodiverso do Brasil” também lembra do impacto ambiental provocado pelo rompimento da barragem da mineradora Samarco em Bento Rodrigues, distrito de Mariana, em novembro de 2015, que causou o despejo de rejeitos tóxicos no Rio Doce, da área da tragédia até o encontro do rio com o Oceano Atlântico. Uma das comunidades afetadas foi a aldeia da etnia indígena Krenak, em Resplendor.
“Já não temos a Mata como antigamente, então a gente tem esse desafio de buscar preservar o que tem e implementar o que está faltando. A gente hoje tem aí um dos maiores crimes ambientais, que aconteceu dentro do nosso território, no Rio Watu [nome pelo qual os Krenak chamam o Rio Doce], que é o rio que corta a nossa aldeia”, resume Itamar Krenak. O Watu, para os Krenak, era fonte de sobrevivência, e suas águas faziam parte até mesmo dos rituais religiosos da comunidade.
“Em 2015 veio esse rompimento dessa barragem, que acabou com nosso rio, acabou com nosso peixe, acabou com a nossa cultura de batizar nossas crianças. O rio sempre foi para o nosso povo uma fonte da vida, e uma fonte de vida espiritual também, com essa parte cultural, do batismo. E hoje a gente não faz isso mais, a gente já não nada mais no rio, não pesca e não batiza nossas crianças. Temos crianças que nasceram há pouco tempo e ainda não sabem o que é nadar, não tiveram essa oportunidade igual eu tive e outros parentes nossos tiveram. É uma grande preocupação com a Mata Atlântica, com o rio e com as nascentes, com o futuro das nossas crianças e do nosso povo”, afirmou o indígena.
Confira esses e outros depoimentos, veja na íntegra o documentário “Mata Atlântica: bioma biodiverso do Brasil”:
(Por Thiago Ferreira Coelho/ Univale)
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