Conhecimento científico é fundamental no processo da consolidação de uma nação livre, independente e justa social e economicamente
“ A Ciência afeta as questões humanas de duas maneiras:
A primeira, é bem conhecida por todos: diretamente e mais ainda indiretamente, a Ciência produz benefícios que já transformaram por completo a existência humana.
A segunda maneira, é de cunho educacional: atua sobre a mente. Embora possa parecer menos óbvia a um exame superficial, ela não é menos incisiva que a primeira”.
Albert Einstein [1]
Introdução
O século XX, foi de grandes transformações para o desenvolvimento da Ciência no Brasil. Os últimos 60 anos desse século, foram de um progresso incessante do ponto de vista de organização institucional e desenvolvimento científico.
Iniciativas importantes para o desenvolvimento científico, foram os trabalhos de Oswaldo Cruz e Vital Brazil, nos primórdios do século XX, a criação da Academia Brasileira de Ciências (ABC), em 1916, a implantação das Universidades do Brasil e Universidade de São Paulo e as pesquisas médicas relacionadas a doenças tropicais. As áreas de Agronomia, Saúde Pública, Biologia, relacionadas com a produção cafeeira, doenças (parasitas) e saúde pública, receberam investimentos e se desenvolveram através da implantação de Institutos de Pesquisa nessas áreas.
A partir da década de 1940, começou um processo bastante efetivo de institucionalização da Ciência no Brasil, principalmente a partir do trabalho e influência dos físicos, capacitados e influenciados pelos avanços mundiais da Física dos quais, o projeto “Manhattan” e a pesquisa nuclear foi paradigma importante. Mas, a influência de pesquisadores estrangeiros, que migraram para o Brasil, na década de 1930, e se instalaram na Universidade de São Paulo (USP), particularmente na Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da USP, foi também de grande impacto. Nesses primeiros anos da década de 1940, o interesse pela Ciência e seu progresso no Brasil, foi intenso e fundamental. Em 1948, fundou-se a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), nos moldes de instituições similares em outros Países.
Também em 1947, criou-se na Constituição do Estado de São Paulo a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), implementada em 1962. Em 1951, a fundação do Conselho Nacional de Pesquisas (CNPq – LEI no. 1.310 de 15 de janeiro de 1951) e da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), foi relevante para a organização institucional do Brasil na área de Ciência, Tecnologia e preparação de professores.
Em 1967, criou-se a Financiadora de Estudos e Projetos (Finep). Esse aparato governamental e a consolidação destas Instituições, teve papel fundamental na pesquisa científica e desenvolvimento tecnológico.
Ao longo de 50 anos, a consolidação da infraestrutura de Ciência no Governo Federal, completou-se com a criação e incorporação de Institutos de Pesquisa Científica nas áreas de Matemática (IMPA); Física (Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas); Amazônia (INPA) – Museu Paraense Emílio Goeldi; Ciências Espaciais (INPE) e outras instituições ao CNPq. Todos esses Institutos, foram incorporados posteriormente ao Ministério de Ciência e Tecnologia. Este Ministério, criado em 1985, consolidou esta etapa do desenvolvimento científico e tecnológico do Brasil.
Outra relevante iniciativa para o Brasil, foi a criação da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), em 1973, que promoveu um extraordinário processo de desenvolvimento científico e tecnológico em agricultura e pecuária no Brasil.[2]
A relevância da pós-graduação e o desenvolvimento científico do Brasil
A promoção e desenvolvimento da pós-graduação no Brasil iniciou-se de forma mais definida ao final da década de 1960, quando os cursos de Mestrado e Doutorado foram implantados em diferentes Universidades do País.
O apoio de Bolsas de Pesquisa pelo CNPq e Capes foi fundamental e o crescimento e consolidação dos programas deve-se a este apoio.
“A preocupação com a transformação social promovida pelo desenvolvimento científico e tecnológico ficou mais evidente e transformou-se em ações e projetos nas duas últimas décadas do século XX e nos primeiros 20 anos do século XXI.”
Também foi importante para o recrutamento de estudantes de pós-graduação, a implantação de um programa de bolsas de iniciação científica. Deve-se enfatizar que o Brasil é um dos poucos países do mundo que tem um programa de Bolsas de Iniciação Científica de alcance institucional.
A expansão dos cursos de pós-graduação em todas as áreas de Ciência e Engenharia foi um processo relevante de evolução do progresso científico no Brasil, pois promoveu a capacitação de milhares de novos pesquisadores que atuaram decisivamente no avanço do conhecimento e na implantação de novas áreas de pesquisa e a infraestrutura de laboratórios. O número de programas de Mestrado e Doutorado, apresentou, de 1996 a 2014, um crescimento de 205% a 210%.[3]
Os avanços institucionais e a inserção da ciência e tecnologia no desenvolvimento econômico e social do Brasil – última década do século XX e início do século XXI
A preocupação com o papel da Ciência e Tecnologia para contribuir com o desenvolvimento econômico, social e cultural do Brasil, acentuou-se a partir da última década do século XX e no início do século XXI. “A pesquisa científica e tecnológica, deve voltar-se para a solução de problemas brasileiros e o desenvolvimento do sistema produtivo nacional”.[4]
Nessa concepção e respondendo às demandas das Universidades, setor produtivo e sociedade, foram criados o Programa de Apoio aos Laboratórios Associados MCT – CNPq (PRONEX, 1996-1977), os Institutos do Milênio – MCT (2000-2001) e os Institutos Nacionais de Ciência e Tecnologia, a partir de 2002-2003. Isto coincidiu também com a expansão e consolidação das pesquisas em Ciências Humanas e Sociais, de grande relevância estratégica para o Brasil.
A capilaridade de processo de pesquisa e promoção da capacitação foi um fator importante no desenvolvimento da Ciência no Brasil. O País, ao longo dos anos, construiu um Sistema Nacional de Ciência e Tecnologia, atuante, diverso e de grande impacto na produção de conhecimento.
A criação do FNDCT, com o Decreto no. 719 de 15 de julho de 1969, também foi uma importante iniciativa. Este projeto tinha o objetivo de apoiar programas prioritários de desenvolvimento científico e tecnológico para o Brasil.
Entretanto, o desempenho do FNDCT foi sempre muito complexo, pois, apesar de períodos de maior aporte financeiro, houve também escassez de recursos associados a crises econômicas do País, nas décadas de 1970 (choque do Petróleo) e 1980 (descontrole inflacionário). O FNDCT, tornou-se um importante instrumento de apoio para o financiamento e consolidação da pesquisa e de Pós-Graduação na Universidade e Pós-Graduação fortalecendo a infraestrutura de C&T.
Um avanço importante no processo de apoio institucional a nível federal, foi a implantação dos Fundos Setoriais em 1998, com a participação da iniciativa privada e a implementação de Comitês Gestores compostos pelas Agências do Governo Federal, iniciativa privada representantes das comunidades científicas. Os recursos foram alocados ao FNDCT. A criação destes Fundos Setoriais, representou o estabelecimento de um novo padrão de financiamento para a Ciência, Tecnologia e Inovação.
A ideia de alocar os recursos dos Fundos Setoriais ao FNDCT, promoveu a garantia de um fluxo contínuo de recursos financeiros para apoio a todas as áreas de Ciência, Tecnologia, Pós-Graduação e capacitação de recursos humanos. Há 16 Fundos Setoriais criados e vinculados ao FNDCT, sendo 13 destinados a setores específicos: Saúde, Biotecnologia, Agronegócio, Petróleo, Energia, Aeronáutico, Transporte (terrestre e aquático) Recursos Hídricos, Informática.
Um desses Fundos, tem por foco a Amazônia Legal. A Figura 1 destaca os investimentos em Ciência e Tecnologia no Brasil no período de 1996 a 2014.
Figura 1. Investimento em Pesquisa e Desenvolvimento (% do PIB)
(Fonte: Banco Mundial/ Lima Silva J. & Tundisi J. G. – 2018)
Outra importante iniciativa, foi a fundação, em 2001 do Centro de Gestão e Estudos Estratégicos (CGEE), no MCT. Este Centro desenvolve análises estratégicas na área de Ciência, Tecnologia e Inovação para o Brasil.
A diversificação e expansão da ciência, tecnologia no Brasil
Com o contínuo processo de institucionalização, o aumento significativo de bolsas de estudo no País, e, para capacitação no exterior, a expansão e consolidação dos Institutos de Pesquisa nas Universidades e no sistema federal (MCT), ocorreu uma grande, competente e abrangente diversificação das atividades de pesquisa com reflexos importantes na produção de conhecimento e nos projetos de desenvolvimento tecnológico, baseados em Ciência Básica.
Uma análise de duas importantes publicações, esclarece este progresso: o volume [2] da Academia Brasileira de Ciências e o volume [5, 6] da FAPESP/ACIESP.
“Muitos problemas relacionados com as demandas da sociedade são solucionados com os avanços promovidos pelo desenvolvimento científico e tecnológico.”
No volume da ABC, 180 cientistas produziram análises, propostas, projetos em Ciências Básicas, Saúde, Meio Ambiente, Clima, Oceanos, Ciência contra a pobreza, Recursos Minerais, Recursos Hídricos, Agricultura e Produção de Alimentos, Cidades e Redes Inteligentes, Biodiversidade, Água, Ar, Solo, Neurociência. O volume ainda contém um amplo capítulo relacionado à inovação como instrumento para a resolução dos principais problemas práticos do País. Neste volume, não só são feitas análises do “estado da arte” nas diferentes áreas, mas há propostas importantes para os avanços necessários em cada área.
O volume apresentado pela FAPESP/ACIESP, além de um histórico completo sobre a atividade da Agência de Fomento Paulista, apresenta os principais projetos que promoveram a Ciência no desenvolvimento do Brasil. Esses abrangem: Mudanças Climáticas Globais e as pesquisas no Brasil sobre este tema, Biodiversidade Terrestre, Marinha e Desenvolvimento Sustentável, Computação, Engenharia, Saúde Humana, Violência e Radicalização.
Entre 2019 e 2022, ocorreu um aumento de pesquisas nos temas Biodiversidade, Inovação, Sustentabilidade e enfrentamento da covid-19.
Análise e avanços da pesquisa científica e suas aplicações, mostram a grande competência internacional das pesquisas desenvolvidas no Brasil, os avanços na interdisciplinaridade e a inserção de problemas sociais e econômicos no processo de desenvolvimento de pesquisa para solucionar problemas nessas áreas no Brasil.
Além desta diversificação e expansão das áreas de pesquisa, dois aspectos fundamentais da Ciência no Brasil, emergem das avaliações recentes que refletem as preocupações de cientistas, gestores e das principais Agências de Fomento.
- A importância do desenvolvimento científico para a resolução dos grandes problemas e desafios que afetam a sociedade brasileira e o País.
- A integração entre Ciência Básica e Desenvolvimento Tecnológico, para, através da inovação, promover o desenvolvimento econômico do País.
Está muito evidente, não só pela participação e atitude dos pesquisadores, cientistas e gestores, e atuação das Agências, que estas ações são fundamentais para o Brasil.
Todos os trabalhos atuais e os de programação futura, têm alta coincidência e contribuição aos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável 2030.[7]
A internacionalização da ciência do Brasil
Com o expressivo aumento das bolsas de capacitação de Doutores em Ciência no exterior (bolsas do CNPq, Capes, Fapesp), aumentou consideravelmente a colaboração internacional.
Segundo dados recentes,[5, 6] a participação de cientistas brasileiros, na cooperação internacional, atinge 42%. Esta colaboração científica está concentrada na USP, UERJ, UFRJ, PUC-RJ e UCB.
Esta pesquisa compartilhada, ocorre em muitas áreas de Ciência, a partir de iniciativas individuais de pesquisadores ou de iniciativas institucionais de colaboração com o apoio de agências internacionais e de países para financiamento das pesquisas.
A colaboração científica internacional, teve um papel muito importante na diversificação das áreas de Ciência e na expansão das publicações internacionais. A participação de cientistas brasileiros em reuniões científica no exterior, ampliou-se extraordinariamente com o apoio continuado do CNPq, CAPES, FAPESP e outras Fundações Estaduais. Isto possibilitou ampliar a dinâmica da pesquisa colaborativa internacional, a troca de informações e dados científicos e a consolidação de metodologias de trabalho em pesquisa.
O desenvolvimento de projetos de colaboração internacional de grande porte como o Projeto Internacional Genoma, apoiado pela Fapesp, é um exemplo desta capacidade do compartilhamento de pesquisas pela Ciência do Brasil. Nas áreas médicas e biomédicas, o índice de colaboração atinge porcentagens acima de 40%.
O aumento de publicações resultantes desta cooperação internacional também resultou em um aumento significativo das citações de cientistas brasileiros em publicações indexadas internacionais de grande relevância.
Os acordos de cooperação internacional do CNPq, CAPES, FAPESP e outras fundações estaduais, também foram ampliados e diversificados, ao longo dos últimos 20 anos. Esses acordos ocorrem com países ou com organizações da América do Norte, Europa, Ásia, América do Sul, África e Oceania.
Os projetos de cooperação internacional, também se desenvolveram mais recentemente, com pesquisas colaborativas entre os países dos BRICS (Brasil, Rússia, China, África do Sul), apoiados por ações conjuntas das Agências de Fomente à Pesquisa, destes países.
O processo institucional
Ao longo de sete décadas, o progresso da Ciência e Tecnologia no Brasil, foi notável e mesmo com a instabilidade financeira em muitas ocasiões a institucionalização foi consolidada. A preocupação com a transformação social promovida pelo desenvolvimento científico e tecnológico, ficou mais evidente e transformou-se em ações e projetos nas duas últimas décadas do século XX e nos primeiros 20 anos do século XXI. Projetos de inovação, implantação de Parques Tecnológicos em muitos municípios, apoio à “startups” foram promovidos e tiveram sucesso.
Há ainda muito a desenvolver: há necessidade de ampliar a adaptação da Ciência às novas realidades do século XXI: escassez da água, insegurança alimentar, mudanças globais, ameaças muito diversificadas à saúde humana.
As profundas alterações no processo de educação, capacitação profissional, necessárias para enfrentar as novas realidades, devem ter apoio decisivo da Ciência e Tecnologia. A interdisciplinaridade, a integração entre as áreas de Ciências Básicas e Engenharias nas Universidades devem promover novos agrupamentos e alternativas importantes na infraestrutura do Brasil e no desenvolvimento econômico.
É indiscutível o papel do Estado no apoio à Ciência, Tecnologia e Inovação, compreendendo múltiplas ações federais, estaduais e municipais, estas últimas com um peso enorme na resolução de problemas locais e regionais. A ampliação dos recursos das indústrias e do setor empresarial no apoio à CTI é também essencial em conjunto com o papel do Estado no fomento à Ciência e Tecnologia, na difusão da Ciência, com mudanças essenciais nos mecanismos e orientação para melhor e efetivo desempenho.
O “século do conhecimento” é o século XXI. Preparar para utilizar este conhecimento no processo da consolidação de um País como nação livre, independente, justa, social e economicamente é o papel que se espera da Ciência, Tecnologia e Inovação no Brasil. A responsabilidade está na atual e futuras gerações de pesquisadores, gestores da Ciência, empreendedores e professores para fazer avançar o Brasil no caminho da prosperidade e justiça social. (Tabela 1)
Tabela 1. Produção científica no Brasil
Em seis anos, a produção brasileira de artigos, cresceu de 32,2% (2015-2020). As áreas de Engenharia, Agricultura, Ciências Ambientais, Química, Ecologia e Física, foram as mais produtivas neste período.[8]
Os principais desafios da ciência, tecnologia e inovação do Brasil em áreas estratégicas
O desenvolvimento da Ciência, Tecnologia e Inovação no Brasil, nos últimos 75 anos, foi expressivo, importante, e trouxe benefícios econômicos e sociais, nas áreas de Segurança Alimentar, Saúde, Meio Ambiente e áreas sociais. O significativo papel da Embrapa nas pesquisas agropecuárias e na produção agrícola é um exemplo deste processo contínuo de produção de conhecimento e sua aplicação, resultante na grande expansão e consolidação do Sistema Nacional de Ciência e Tecnologia.
No entanto, os desafios para ao futuro e as demandas da sociedade, são também de altíssima relevância, e a Ciência, Tecnologia e Inovação no Brasil, devem ter uma participação cada vez maior e mais efetiva para a solução das demandas futuras. Para isto, é necessário um contínuo suporte de recursos financeiros para o funcionamento de projetos, de pesquisa e inovação com suporte aos pesquisadores, Centros e Institutos de Pesquisa, Universidade e redes nacionais e internacionais de pesquisa.
O suporte às iniciativas de empreendedores e a “start-ups” com a articulação pesquisa — inovação, Universidade — Indústria, é também fundamental.
Uma avaliação e resumo destes principais desafios estratégicos, nos próximos 50 anos para o Brasil, nos apresenta um quadro diversificado e amplo. Esta avaliação, ainda que incompleta, mostra a diversidade de ações necessárias com apoio decisivo da Ciência, Tecnologia e Inovação, e terão impacto positivo do desenvolvimento do País.
- Transição energética e política energética nacional. Mudanças na matriz energética do Brasil. Aumentar a eficiência das células solares e sistemas fotovoltaicos. Aperfeiçoar os sistemas concentradores de energia solar. Dar ênfase aos parques eólicos “offshore”, principalmente nas áreas costeiras, Norte e Nordeste.[9]
- Biodiversidade terrestre, marinha e de águas interiores. Conservação, Recuperação, Avaliação Econômica da Biodiversidade, Estudo Integrado dos Biomas do Brasil. Avaliação econômica dos serviços ecossistêmicos.[10, 11] Promover um Biota-Brasil, nos moldes do Biota-Fapesp.
- Mudanças climáticas – Impactos, cenários, perspectivas econômicas e sociais. Adaptação às mudanças climáticas – Impactos na saúde humana. Regionalização das projeções climáticas e ocorrência de extremos no Brasil. Intensificar a coleta de dados socioeconômicos, para elaborar cenários de impactos e promover ações para políticas públicas eficazes. [12, 13]
- Segurança alimentar – A Academia Brasileira de Ciências, desenvolveu um extenso estudo sobre Segurança Alimentar,[14] que destaca os principais problemas e aponta as soluções para resolver os problemas de Segurança Alimentar para 33 milhões de brasileiros.[15] “A Ciência Brasileira é fundamental para resolver o problema de Segurança Alimentar para 33 milhões de brasileiros pela sua capacidade multidisciplinar e ações transversais” (Helena Bonacini Nader Presidente da ABC). A Figura 2 destaca o papel fundamental do Brasil na Produção Mundial de Alimentos.
- Implantação de Cidades Inteligentes – Integrar dados ecológicos, econômicos e sociais em um banco de dados para as cidades (Bigdata Bank), para desenvolver Cidades Inteligentes, articuladas e com visão sistêmica, avançar a cultura da sustentabilidade e Cidades Inteligentes.[16, 17] Implantar Cidades Inteligentes como laboratórios
- Ciência, Tecnologia e Saúde Humana – Aprofundar as pesquisas médicas, apoiar a consolidação e a capacitação de redes de pesquisa clínica, e investir em formação e capacitação de equipes multidisciplinares, que integrem e articulem pesquisadores entre a pesquisa básica e a clínica. Promover pesquisas em farmacogenética, farmacogenômica, e desenvolvimento de imunobiológicos e vacinas.[18] Articular políticas públicas, econômicas e de saúde, e, fortalecer a pesquisa científica, tecnológica e inovadora para o fortalecimento do SUS.[5, 6] Doenças tropicais negligenciadas, tem especial interesse para o Brasil. Desenvolvimento de medicamentos imunológicos e terapias moleculares. Bases moleculares das doenças.
- Pesquisas em capacidade cognitiva, e genética de idosos, para compreender o processo de envelhecimento e suas relações com os processos econômicos e sociais.[5, 6]
- Ampliação dos projetos e pesquisas científicas em Ciências Humanas, vulnerabilidades, avaliação de processos sociais e sua relação com a qualidade de vida da população. Ciência contra a pobreza. Ciência para o desenvolvimento de novas tecnologias que viabilizam o acesso dos mais pobres a determinados bens e serviços. Apoio da Ciência à redução de desigualdade no País.[19]
- Inteligência Artificial – A Inteligência Artificial (I.A.), serve um conjunto importante de oportunidades com benefícios, e também, riscos existentes. A Academia Brasileira de Ciências, promoveu uma análise da I.A. a nível global,[20] discutindo as perspectivas do uso de I.A em Saúde, Educação, Pesquisa Científica, Competitividade de Empresas, Eficiência e Governança do setor público e investimento necessário.
Figura 2. A projeção do Brasil na produção mundial de alimentos
(Fonte: Melo Franco et. al., 2022)
Outras áreas relevantes em que o Brasil tem se destacado, mas é necessário aprofundar o conhecimento cientifico, e a aplicação são:
- Promover aplicações do programa espacial, no atendimento das demandas civis e de defesa com sensoriamento remoto do ar, solo, oceanos. A modernização do Segmento Espacial Brasileiro da Coleta de Dados Ambientais também é uma das prioridades. O Programa Espacial Brasileiro possibilitou ao INPE prover uma série de tecnologias e informações cientificas de grande relevância para a sociedade.[21] As atividades de pesquisa básica na área espacial devem ter prioridade no Programa Espacial Brasileiro.
- Como destacado por Medeiros et al., 2022 [22] as aplicações da Bioinformática e Biologia Computacional são fundamentais em todas as áreas de Ciências da Vida. Técnicas modernas e avançadas de edição de genes são a base para a manipulação genética de organismos. A articulação entre as áreas de computação e Biologia avançada, que já apresentou inúmeros resultados no Brasil é uma das principais prioridades. O desenvolvimento de Plataformas Computacionais e a disseminação maciça de programação também são de extrema importância peara a informação de população e para ampliar a oportunidade de desenvolvimento cientifico e a expansão de programas de aplicativos que podem beneficiar milhões de pessoas. Diagnóstico de problemas sociais, estudo de cenários sobre mudanças climáticas e impactos econômicos e sociais, e avaliação de problemas na Saúde Humana, podem ter grande avanço com o desenvolvimento de computação e de informática. Grupos especializados em Bioinformática e programas de pós-graduação foram implantados com repercussões positivas em pesquisa e desenvolvimento.
- Monitoramento e pesquisas no ar, solo, água, gestão de recursos hídricos, oceanografia, são outras áreas de relevante interesse para o Brasil que já contam com áreas consolidadas e recursos humanos qualificados de alto nível internacional.
A Ciência e Tecnologia no Brasil, tem desenvolvido capacidades fundamentais de pensamento e posicionamento estratégico, através de suas principais organizações científicas, como a Academia Brasileira de Ciências, a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, a Academia de Ciências do Estado de São Paulo, e as sociedades científicas. Estas iniciativas, tem sido de grande relevância para impulsionar cada vez mais a densidade a inserção da Ciência, Tecnologia e Inovação nas políticas públicas, federais e estaduais.
Há obstáculos a superar. Um destes, é a instabilidade no financiamento à pesquisa no Brasil. Para consolidar sua capacidade competitiva ao nível mundial, há necessidade de ampliar os investimentos em Ciência e Tecnologia. O investimento do setor industrial em pesquisa ainda é muito baixo no Brasil.
O Brasil ocupa, no índice global de inovação, o 69º lugar, e o 80º lugar no índice de competitividade global.
Investimento em pesquisa e desenvolvimento, e o número de cientistas e engenheiros são fundamentais para ampliar a competitividade e inovação no País.
As maiores economias mundiais, como Estados Unidos, Alemanha, Japão, China, Coréia do Sul, são os que mais investem em Ciência, Tecnologia e Inovação (Figura 3).
Figura 2. Percentual dos dispêndios em P&D em relação ao PIB
O tamanho do círculo reflete o dispêndio anual em pesquisa e desenvolvimento pelo país indicado.
(Fonte: Gomes de Oliveira, Guimarães J. A. & Prata A.T., 2018)
O ideal para o Brasil é ter uma meta de investimento do PIB em 2% em Pesquisa e Desenvolvimento e três mil cientistas e engenheiros por milhão de habitantes com incentivos expressivos nessas carreiras.[23]
A contribuição da Ciência e Tecnologia, é essencial para viabilizar o desenvolvimento do Brasil e redução das desigualdades e melhorar decisivamente a qualidade de vida da população nas áreas de Educação, Saúde, Mobilidade Urbana, geração de emprego e renda, moradias qualificadas e bem-estar social. Muitos problemas relacionados com as demandas da sociedade são solucionados com os avanços promovidos pelo desenvolvimento científico e tecnológico.
Há ainda outro problema que é crucial: é a expansão da institucionalização da Ciência e Tecnologia, local e regionalmente. A ação estratégica de Ciência e Tecnologia, municipalmente, é a próxima etapa para o aprofundamento deste processo. Aprofundar os laços entre Ciência, Tecnologia e Educação do ensino básico à Pós-Graduação, e ensino técnico e profissional nos municípios será um avanço fundamental ainda pouco desenvolvido no Brasil.[4, 24] O Brasil precisa de programas de relevância para a gestão e proteção ambiental a nível municipal. A contribuição da Ciência, Tecnologia e Inovação nessa área é de máxima importância para a construção de um futuro sustentável e integrado com os processos naturais.
O investimento em Ciência, Tecnologia, o apoio à Inovação a nível municipal tem um papel fundamental na resolução de problemas locais em todas as áreas.[25] Os avanços em Tecnologia da Informação (T.I) municipalmente, o uso da Inteligência Artificial para solucionar os problemas nos municípios é fundamental e este processo é fundamental para o desenvolvimento mais equilibrado e consolidado do Brasil, no século XXI.[26]
A inserção de Ciência, Tecnologia e Inovação nos municípios deve contar com a implantação de Fundos Municipais de Apoio à Ciência, Tecnologia e Inovação, para promoção de pesquisas e projetos, que deverão solucionar problemas locais e regionais, implementação de Agências Locais de Desenvolvimento, que promoverão o investimento em iniciativas de “start-ups” e Conselhos Municipais de Ciência, Tecnologia e Inovação, que deverão promover e apoiar estudos estratégicos, projetos de inovação para desenvolver os municípios, através de Ciência, Tecnologia e Inovação, com grandes reflexos econômicos na qualidade de vida, em geração de emprego, renda e bem-estar social.
“O Brasil precisa de programas de relevância para a gestão e proteção ambiental a nível municipal. A contribuição da Ciência, Tecnologia e Inovação nessa área é de máxima importância para a construção de um futuro sustentável e integrado com os processos naturais.”
Há outro componente, vital para a promoção de Ciência, Tecnologia e Inovação no Brasil, como indutor do processo de desenvolvimento econômico, social e redução das desigualdades. Este componente, está relacionado com a capacitação de recursos humanos qualificados para enfrentar os desafios acima enumerados.
A implantação da interdisciplinaridade e multidisciplinaridade nos programas de graduação, pós-graduação e especialização nas Universidades, Institutos de Pesquisas, é um passo e etapa importante nesta capacitação.
Os desafios existentes atualmente, a nível planetário, e no Brasil, como as Mudanças Globais e Pandemias, além dos inúmeros problemas na área econômica só poderão ser enfrentados de forma consistente e permanente com a participação efetiva de cientistas, técnicos, professores e educadores com uma visão sistêmica dos processos, incluindo estoques e fluxos. Estes, tem um caráter eminentemente interdisciplinar, multidisciplinar e dinâmico, e sua solução depende da análise de sistemas complexos no espaço e tempo.
A preparação destas novas capacidades envolve extensas reformulações e readequações para promover a solução de problemas de grande envergadura que afetam o Brasil, sua infraestrutura, a economia, a saúde da população e a qualidade de vida.
Conclusões
A decisão política de apoiar o desenvolvimento de Ciência, Tecnologia no Brasil, já tem mais de sete décadas de contínuo avanço. Além do apoio à Ciência Básica, o sistema de fomento a nível federal e em Fundações Estaduais, também promovem o apoio decisivo à inovação. A expansão do conhecimento científico no Brasil, em todas as áreas de Ciências, resultou em um enorme acúmulo de informações científicas fundamental, que nos últimos 20 anos do século XX e nos primeiros 20 anos do século XXI, inspirou e promoveu a transformação deste conhecimento em projetos aplicados na indústria e em muitas áreas de Saúde, Agronegócio, Tecnologia da Informação, Computação, Biodiversidade, Genética, Ciência Espacial.
Embora ainda limitado a regiões do País e a um certo número de municípios, este processo teve impactos importantes e o modelo está estabelecido.
O modelo local e regional de apoio à Ciência, Tecnologia e Inovação, é a nova fase e etapa para a consolidação do conhecimento científico e inovação com o componente fundamental que o Brasil precisa para sua transformação social.
Cidades laboratórios deste modelo existem no Brasil, e, a expansão destas iniciativas, deverá promover avanços na redução das desigualdades, melhor Educação, maiores oportunidades de aproveitamento de talentos e a implementação de iniciativas inovadoras de grande impacto.[24, 27, 28]
A coalizão das áreas de Ciências Básicas e produção de conhecimento com as iniciativas de empreendedores é outra urgente necessidade que pode, sem dúvida, ser resolvida com a expansão da articulação, o apoio imediato do Estado (Federal, Estadual e Municipal). Aqui, se acentua que o modelo local e regional pode fazer grande diferença qualitativa e quantitativa.
Uma recomposição do financiamento à Ciência, Tecnologia e Inovação, a partir de 2023, abriu novas perspectivas no desenvolvimento científico do Brasil. Desde 2023, por exemplo, o CNPq passou a ser o executor de uma parcela maior de recursos do FNDCT, tendo participação direta em 5 das 10 ações prioritárias.[29]
Esta significativa iniciativa recupera a capacidade de investimento e ação da principal Agência de Fomento à Pesquisa no País, e, reconduz o CNPq ao seu papel histórico da agência estratégica em Ciência, Tecnologia e Inovação. Além disto deve-se destacar que em 2023 o investimento federal em Ciência, Tecnologia e Inovação (FNDCT) foi de 10 bilhões de reais, aproximadamente 1,2% do PIB do Brasil.
Para o Brasil ter uma efetiva política de Estado, consolidada, efetiva e contínua, são fundamentais estudos e avaliações estratégicas, discussões e propostas; a 5ª Conferência Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação, pode proporcionar e promover este Fórum e oportunidades.[30]
Fundações de Amparo às Pesquisas Estaduais e EMBRAPii: uma relevante iniciativa
A Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo, instituída na Constituição de 1947, e, implantada em 1962, é um dos exemplos mais importantes do apoio à pesquisa no Brasil. Um dos aspectos fundamentais de atuação da FAPESP, é continuidade dos recursos através de inicialmente, 0,5% dos impostos do Estado de São Paulo, e mais tarde, em 1989 — 1%. Uma das ações altamente positivas da Fapesp limitou o dispêndio com a administração a 5% do orçamento da Agência.
Esta continuidade no financiamento, e indicação de cientistas de alto nível para a Diretoria Científica, promoveram condições excepcionais de desenvolvimento científico e tecnológico, não só para o Estado de São Paulo, mas para o Brasil. Projetos fundamentais como o Projeto GENOMA, o Projeto Biota-Fapesp, os Projetos PIPE (Projetos de Inovação em Pequenas Empresas), foram de grande importância para o desenvolvimento cientifico e sua aplicação.
Além disto, a internacionalização da Ciência do Brasil, deve muito à atuação da Fapesp.[5, 6]
Os Centros de Pesquisa, Inovação e Difusão (CEPIDs), estabelecidos a partir de 1998, estruturados com apoio de até 11 anos para produzir pesquisa de excelência, inovação para transformar conhecimento para o setor produtivo, difusão de Ciência, para o grande público foram iniciativas de grande alcance estratégico. Atualmente, 19 CEPIDs em todas as áreas de ciências básicas e aplicadas estão atuando. A Figura 4 destaca os resultados de um dos programas fundamentais e altamente relevantes da Fapesp o Biota-Fapesp.
Figura 4. O Projeto BIOTA/FAPESP
(Fonte: Joly C. A. et. al., 2022)
A implantação de outras Fundações de Amparo à Pesquisa, em Minas Gerais (FAPEMIG), Rio Grande do Sul (FAPERGS); Rio de Janeiro (FAPERJ) e Fundação Araucária do Estado de Paraná, promoveu um papel relevante ao desenvolvimento científico destes Estado e do Brasil.
A Empresa Brasileira de Pesquisa e Inovação Industrial (EMBRAPii) é uma organização social privada, sem fins lucrativos, vinculada ao Ministério da Ciência, Tecnologia e inovação. O modelo desta organização, tem por finalidade, integrar instrumentos e iniciativas na busca de soluções tecnológicas inovadoras para a inovação industrial. Esta nova empresa completa o ciclo de investimentos em áreas aplicadas de Ciência no Brasil e sua expansão e continuidade terá reflexos de grande repercussão econômica e social.
Agradecimentos
O autor agradece à Mirian Aparecida Meira, Karina Varanda Morilha Néo e Marco Brugnera dos Santos, pelo apoio na organização desta revisão.
