A Universidade é central na definição de novos rumos para a sociedade contemporânea
Há séculos, em todo o mundo, a Universidade tem sido reconhecida como a fonte das ciências, a casa das palavras, o espaço das culturas e o lugar do pensamento. O pensamento define a Universidade. Pensar, repensar, pensar-se. Pensar a Universidade, por dentro de si e para si mesma, é fundamental, porém pensar a universidade para e no contexto planetário é urgente. Ao fazê-lo, temos uma oportunidade de dialogar com os governantes e com a Sociedade. Nada mais apropriado do que apresentar ideias, propostas, soluções e caminhos para as universidades brasileiras neste momento de nosso País. Ao pensar suas raízes históricas, ao pensar mais amplamente, ao pensar à frente do tempo, a Universidade se faz decisiva para o futuro da nação.
A Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) propõe, para o primeiro número da revista Ciência & Cultura de 2023, uma edição temática sobre a Universidade do Futuro. Esta edição está composta por uma série de artigos que abordarão diversos aspectos do tema em profundidade; além de vídeos e podcasts com foco em questões atuais sobre o tema central; entrevistas com cientistas e pesquisadores, testemunhas e protagonistas desse momento; bem como reportagens e textos de opinião, elaborados por especialistas a partir de textos escritos por jornalistas.
Nos últimos anos, a educação pública, a ciência e a pesquisa brasileiras sofreram agressões intensas e contínuas, patrocinadas principalmente pelo governo do ex-presidente Jair Bolsonaro. Muitas formas de ataque foram utilizadas, desde campanhas difamatórias, ingerência na escolha de dirigentes, perseguição de docentes, além da profunda e arrasadora asfixia financeira. Difícil imaginarmos como, diante desse cenário, foi possível sobreviver, resistir e ainda realizar grandes feitos durante essa pandemia que foi a maior crise sanitária de nossas gerações. Apesar da pandemia da covid-19 parecer distante agora, seus efeitos se encontram mais próximos do que imaginamos, com as ameaças advindas das mudanças climáticas. Nesse contexto, as universidades, especialmente aquelas do setor público, trouxeram contribuições centrais para a resolução de problemas e para a proteção da população. Enfim, é preciso jogar luz nos legados da pandemia, a partir do esforço das universidades que, inovadoras nas respostas e emancipatórias nas conquistas sociais, certamente continuarão com a produção de conhecimento científico e tecnológico crucial para o enfrentamento de novos desafios de saúde da população.
“As universidades, especialmente aquelas do setor público, trouxeram contribuições centrais para a resolução de problemas e para a proteção da população.”
Vivemos na universidade uma pandemia, ao mesmo tempo em que sofremos uma enorme restrição de recursos. A Sociedade Brasileira respondeu com uma inédita “onda pró-ciência”, com o reconhecimento de boa parte da população da importância da Ciência que salvou vidas. Além disso, assistimos à afirmação do conhecimento baseado em evidências históricas e científicas, posto que parcela significativa da população brasileira se recusou a aderir às fake news e ao negacionismo científico. Nesse momento, as universidades ganharam grande destaque e popularidade. Porém, a partir da ampla vacinação e do arrefecimento da pandemia, além de superadas as questões eleitorais de 2022, vemos agora que movimentos obscurantistas anti-ciência parecem ganhar novos contornos, espaços e adeptos, com investidas cada vez mais sofisticadas e elaboradas, aumentando muito o desafio das universidades e aos formuladores de políticas públicas em relação ao futuro.
O ano de 2023 surge com a esperança de reconstrução nacional, a partir da união de esforços e da condução política para o retorno dos processos democráticos. O momento agora é de redesenhar os sistemas de educação e de pesquisa & desenvolvimento, retomar sua expansão e colaborar decisivamente no sentido de reconstruir e também de reinventar o Brasil, depois dos trágicos anos que vivemos. Sabemos que, para isso, precisaremos garantir processos políticos estruturais, além de retomar políticas públicas que contemplem a Educação e a Ciência como áreas estratégicas para o Estado. Neste momento crucial, entra em cena a Universidade, instância formuladora de princípios, defensora de valores e pensadora de futuros e, por tudo isso, central na definição de novos rumos para a sociedade contemporânea. Ao pensar no futuro, pensamos no aqui-agora, no que temos efetivamente na Universidade brasileira, uma capacidade instalada que está latente e que é capaz de gerar o novo e dialogar com saberes transformadores do mundo.
A partir deste 2023, ano de reconquista e reconstrução, poderemos resgatar e retomar o trabalho valioso de Darcy Ribeiro e de Anísio Teixeira, que continuam atuais e, em muitos sentidos, orientadores e inspiradores. Para Darcy Ribeiro, o papel social da universidade se cumpriria quando ela saísse de dentro dos seus muros, amplificasse a conexão com a sociedade e contasse com instrumentos de comunicação de massa: rádio, TV, setor editorial, imprensa e cinema (e hoje, certamente ele incluiria as diversas modalidades digitais). Será que esse momento é agora? Ou teremos que persistir lutando para construir um novo momento no futuro?
“Neste momento crucial entra em cena a Universidade, instância formuladora de princípios, defensora de valores e pensadora de futuros e, por tudo isso, central na definição de novos rumos para a sociedade contemporânea.”
Por tudo isso, ao pensarmos o tema dessa primeira Ciência & Cultura de 2023 e também a Universidade do Futuro no Brasil, precisamos falar mais da “universidade necessária”, em diálogo permanente com a sociedade, com os movimentos que dela provém, bem como com os desafios do “tempo presente”. A Universidade será estratégica para a composição de uma sociedade mais justa, solidária e sustentável, que terá como base o conhecimento científico e que enfrentará os desafios para a reconstrução de nossa Nação.