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História das mulheres na ciência brasileira

Ciência no Brasil é marcada pela presença feminina, mas ainda há muitos obstáculos a serem vencidos

 

A história da educação feminina no Brasil é uma narrativa que reflete uma longa jornada de superação de desigualdades. Paralelamente à evolução do mundo ocidental, as mulheres brasileiras ingressaram tardiamente nas instituições de ensino. Tradicionalmente, suas formações estavam voltadas para os cuidados do lar. Somente em 1879, sob o governo imperial, as mulheres conquistaram o direito de ingressar nas faculdades, mas com a condição de obterem a aprovação de seus pais ou maridos.

Hoje, o Brasil é marcado por uma realidade demográfica notável, onde as mulheres representam a maioria da população há 27 anos, de acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Além disso, elas correspondem a 49% do total de bolsistas do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). À primeira vista, esses números sugerem uma igualdade na pesquisa nacional, mas um exame mais detalhado revela que a ciência brasileira ainda enfrenta desafios consideráveis.

O CNPq relata que 59% das bolsas de iniciação científica são concedidas a pesquisadoras, mas essa proporção cai para 35,5% nas bolsas de produtividade, que são as mais prestigiadas e financiadas. Dentro desse grupo, as bolsas 1A, destinadas a pesquisadores sêniores, são majoritariamente concedidas a cientistas do gênero masculino, representando apenas 24,6% das premiações para cientistas femininas.

 

As raízes da ciência no Brasil: desafios do passado e conquistas inspiradoras

A história das instituições científicas no Brasil remonta ao reinado de D. Pedro II, quando surgiram as primeiras instituições de ciências exatas, como a Escola Politécnica da Cidade do Rio de Janeiro, em 1874. O Imperial Observatório do Rio de Janeiro, atual Observatório Nacional, foi criado em 1845, enquanto o Instituto Agronômico (IAC), localizado em Campinas (SP), surgiu em 1887. No período republicano, o país testemunhou o surgimento de diversas outras instituições de pesquisa, como a Escola Politécnica de São Paulo em 1894, o Instituto Butantan em 1899 e o Instituto Oswaldo Cruz (IOC) em 1907.

Nesse contexto, a maioria dos pesquisadores e professores dessas instituições eram homens estrangeiros ou brasileiros formados no exterior. No entanto, uma notável exceção foi a presença de Emilia Snethlage, que se graduou na Alemanha e chegou ao Brasil em 1905 para trabalhar como assistente de Zoologia no Museu Emílio Goeldi, em Belém do Pará. Ela publicou uma obra fundamental que catalogava mais de 1.100 espécies de aves amazônicas. (Figura 1)


Figura 1. Emília Snethlage
(Foto: Museu Paraense Emílio Goeldi. Reprodução)

 

Mulheres pioneiras na ciência brasileira: inspiração e legado

A história da ciência brasileira também é enriquecida por mulheres que superaram as barreiras de acesso à educação, abrindo caminho para outras cientistas e servindo de inspiração para as gerações futuras. Uma delas é a bióloga paulista Bertha Lutz, cujas contribuições transcendem o campo científico. Nascida em 1894, Bertha Lutz foi uma das pioneiras na luta pelo voto feminino no Brasil e desempenhou um papel fundamental na pesquisa zoológica, especialmente nas espécies anfíbias brasileiras. (Figura 2)


Figura 2. Bertha Lutz
(Foto: Reprodução)

 

Outra figura notável é Marta Vannucci, a primeira mulher a se tornar membro titular da Academia Brasileira de Ciências (ABC) em 1955. Nascida na Itália em 1921, dedicou sua vida à pesquisa dos ecossistemas dos mangues, tornando-se uma das maiores especialistas do mundo nesse campo e desempenhando um papel crucial na fundação do Instituto Oceanográfico da USP. (Figura 3)


Figura 3. Marta Vanucci
(Foto: ABC. Reprodução)

 

Graziela Maciel Barroso, natural de Corumbá, Mato Grosso do Sul, é considerada a “primeira dama da botânica do país”. Ela trabalhou no Jardim Botânico do Rio de Janeiro, ingressou na faculdade aos 49 anos para estudar Biologia na Universidade do Estado do Guanabara (atual Universidade do Estado do Rio de Janeiro – UERJ) e se tornou a maior catalogadora de plantas do Brasil, com mais de 25 espécies vegetais batizadas em sua homenagem. (Figura 4)


Figura 4. Graziela Maciel Barroso
(Foto: Instituto de Botânica/ Governo do Estado de S. Paulo. Reprodução)

Mulheres nas ciências exatas: desafios e progressos

Nas últimas décadas, avanços significativos foram alcançados na promoção da igualdade de gênero na ciência. No entanto, dados do CNPq de 2017 revelam que ainda existe uma grande disparidade de gênero nas ciências exatas. Enquanto nas áreas de Saúde, Linguística, Letras e Artes, e Biológicas, há mais mulheres cientistas do que homens, nas Ciências Exatas e da Terra, elas representam apenas 34%, e em Engenharia e Computação, apenas 36% do total.

No entanto, mulheres notáveis abriram caminhos para outras na pesquisa das chamadas “ciências duras”. Yolande Anna Esther Monteux, uma francesa que chegou ao Brasil em 1913 e tornou-se a primeira mulher a se graduar em Física no país, na Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da USP, em 1937. Outra pioneira foi Sonja Ashauer, a primeira brasileira a concluir um doutorado em Física em 1948, na Universidade de Cambridge. (Figura 5)


Figura 5. Sonja Ashauer
(Foto: Reprodução)

 

A polonesa Blanka Wladislaw chegou ao Brasil aos 14 anos e revolucionou o campo de Eletroquímica Orgânica nas décadas de 1950, após estudar no Imperial College of Science and Technology da Universidade de Londres. Além disso, ela desempenhou um papel crucial no ensino e na pesquisa de Química Orgânica na USP.

Em Matemática, Elza Furtado Gomide foi a primeira mulher a obter um doutorado em Matemática em uma instituição nacional. Sua contribuição para o campo foi notável, liderando o Departamento de Matemática da USP em 1968. (Figura 6)


Figura 6. Elza Furtado Gomide
(Foto: Reprodução)

 

Contribuições na Medicina e na Saúde

Na área da saúde, mulheres cientistas realizaram descobertas fundamentais que transformaram tratamentos médicos e práticas de saúde no Brasil. Nise da Silveira, médica psiquiatra, introduziu abordagens inovadoras no tratamento de pacientes psiquiátricos, promovendo a terapia ocupacional e a expressão artística como parte integrante do tratamento. (Figura 7)


Figura 7. Nise da Silveira
(Foto: Reprodução)

 

Adriana Melo, uma médica brasileira, ganhou reconhecimento internacional por seu trabalho no estudo do vírus Zika e suas consequências para os fetos. Sua pesquisa foi crucial para a compreensão e prevenção da microcefalia em bebês nascidos de mães infectadas pelo vírus. (Figura 8)


Figura 8. Adriana Melo
(Foto: Reprodução)

 

Desafios contínuos

Embora tenhamos feito progressos notáveis na inclusão de mulheres na ciência, ainda há desafios a serem superados. O estímulo à educação e à participação das mulheres em campos STEM (Ciência, Tecnologia, Engenharia e Matemática) deve ser contínuo. Isso inclui políticas que promovam a equidade de gênero em bolsas de pesquisa, promoção de mentorias para jovens cientistas e a criação de ambientes de trabalho inclusivos.

Além disso, a representatividade nas lideranças acadêmicas e institucionais é fundamental para criar uma cultura de igualdade na ciência. É importante que mais mulheres ocupem cargos de destaque nas universidades, institutos de pesquisa e órgãos de fomento à pesquisa. A diversidade de perspectivas e experiências é fundamental para o avanço da ciência e para resolver os desafios globais que enfrentamos. Portanto, é fundamental continuar promovendo a participação ativa das mulheres na ciência e celebrar suas contribuições inestimáveis.

Blog Ciencia e Cultura

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