Ubirajara jubatus. Este é o nome do primeiro dinossauro encontrado no Hemisfério Sul que exibia o que eram provavelmente os precursores das penas modernas. Mas isso é apenas um dos motivos que o tornaram um fóssil famoso. O outro — bem mais polêmico — é o fato de que, apesar de o fóssil de 110 milhões de anos ter sido coletado no Brasil décadas antes, nenhum paleontólogo brasileiro tinha ouvido falar dele.
A publicação do artigo sobre o fóssil brasileiro na edição de março de 2020 da revista Cretaceous Research é apenas o mais recente caso do que alguns pesquisadores chamam de “colonialismo paleontológico”, que é quando cientistas de nações ricas obtêm espécimes de países de baixa e média renda sem envolver pesquisadores locais e depois armazenam os fósseis no exterior.
A prática do colonialismo paleontológico é considerada ilegal por muitas nações. Segundo a lei brasileira, os fósseis do país pertencem ao Estado. Mas não é só: a prática também pode privar as nações de conhecimento e patrimônio.
Impacto
A publicação do artigo sobre o Ubirajara jubatus na revista acabou provocando uma revolução. Ao tomarem conhecimento sobre o fóssil, pesquisadores brasileiros protestaram contra o artigo e pediram a devolução do fóssil através da campanha no Twitter #UbirajaraBelongstoBR (Ubirajara pertence ao Brasil). O artigo acabou sendo retratado e atualmente o Museu Estadual de História Natural Karlsruhe, na Alemanha, está negociando a devolução do espécime ao Brasil.
O incidente também levou paleontólogos e associações de paleontologia em toda a América Latina a unir forças para acabar com a prática. O movimento crescente está até atraindo o interesse de cientistas da Mongólia e de outros países além da América Latina afetados pela paleontologia colonial.
O resultado tem sido a publicação de artigos investigando a extensão do colonialismo paleontológico. Um relatório publicado em março deste ano na Royal Society Open Science revisou décadas de artigos descrevendo fósseis do México e do Brasil. Os autores analisaram quase 200 estudos publicados entre 1990 e 2021 e descobriram que mais da metade não incluía pesquisadores locais. Dos fósseis brasileiros descritos, 88% foram armazenados fora do Brasil. O artigo também descobriu que nenhum dos estudos revisados tinha permissão para levar os fósseis para o exterior.
Pesquisadores latino-americanos também aumentaram a conscientização global sobre a paleontologia colonial em conferências internacionais. Em dezembro passado, o terceiro Congresso Virtual Paleontológico anual apresentou uma pesquisa analisando o impacto da campanha #UbirajaraBelongstoBR. Em julho, um painel discutirá o colonialismo científico no Congresso Latino-Americano virtual de Paleontologia de Vertebrados. O esforço coletivo espera trazer avanços para a pesquisa local.
* Com informações da revista Nature