Regressando à Europa após o descobrimento da América, que ele achava ser as Índias (Ásia), o navegador genovês Cristóvão Colombo parou em Lisboa em 1493 e relatou sua façanha a D. João II. O descobrimento tinha ocorrido numa expedição financiada pela rainha Isabel de Castela, pois D. João II havia recusado a Colombo o apoio que ele tinha pedido em 1484. Essa negativa foi pelo fato de Colombo pretender chegar ao Oriente navegando para o oeste, sentido contrário do que estavam tentando os navegadores portugueses após cruzar o Cabo da Boa Esperança. Assessorado por bons geógrafos, D. João II devia saber do equívoco de Colombo, achando ter chegado às Índias. Mas ele já se preocupava em assegurar a Portugal o direito pelas terras que fossem descobertas, pois aparentemente ele já sabia da existência do Brasil.
De fato, Cabral pode não ter sido o primeiro a chegar às costas do Brasil, pois D. Manuel I, sucessor de D. João II teria encarregado o navegador e explorador Duarte Pacheco Pereira (1460-1533) de comandar uma expedição para reconhecer o lado ocidental do Atlântico Sul. Pereira teria chegado ao litoral norte do Brasil, nos atuais estados do Amazonas, Pará e Maranhão. Nesse sentido, ele teria chegado ao Brasil antes de Cabral. Há relatos sobre Pereira, mas não há documentos comprobatórios, até porque essa viagem seria secreta.
Portugal já tinha conquistado domínios na costa ocidental africana para exploração marítimo-comercial. A Espanha acabava de constituir o seu estado nacional e pretendia também iniciar sua exploração marítimo-comercial, apostando na descoberta de Colombo. Assim sendo, fazia sentido que D. João II achasse necessário firmar um tratado de partição do globo entre Espanha e Portugal.
A pedido dos espanhois feito num gesto preventivo, em 1493 o papa emitiu uma bula atendendo ao apelo da Espanha pelo direito de posse de todas as terras descobertas ou por descobrir, localizadas a oeste do meridiano situado 100 léguas a oeste do Cabo Verde. As terras localizadas a leste pertenceriam a Portugal. Mas D. João II não aceitou essa imposição. A disputa foi resolvida em 1494 sem o papa, envolvendo apenas os representantes de D. João II de Portugal e dos reis Fernando e Isabel da Espanha, numa reunião na cidade espanhola de Tordesilhas. Agora, o Tratado de Tordesilhas estatuía que o meridiano de divisão das novas terras estaria não 100 léguas, mas 370 léguas a oeste do arquipélago do Cabo Verde. Isso asseguraria para Portugal um maior território do Brasil ainda não descoberto oficialmente, e também o direito à navegação nos mares a leste do Cabo da Boa Esperança.
Na prática, o meridiano de Tordesilhas nunca pôde ser determinado com precisão: a própria determinação de longitude, como já vimos, já era eivada de incertezas; e o próprio Tratado deixava ambiguidades, pois o arquipélago de Cabo Verde compreende várias ilhas e se estende por cerca de 3º de longitude. Não obstante, o tratado foi aceito por ambas as partes e entrou em vigência, com o importante detalhe: não foi sancionado pelo papa. Assim o Tratado de Tordesilhas de 1494 foi o primeiro tratado internacional só entre estados.
Embora no achamento do Brasil um Novo Mundo tivesse acabado de surgir, com novas terras, novas riquezas naturais e novos povos, já havia um fundamento legal para a posse de novas terras. Alegando enormes investimentos e labores, preciosas vidas de corajosos navegadores e o talento dos criadores das novas técnicas navais, Portugal como nação reivindicou o direito à posse das terras recém “descobertas” e ao monopólio comercial dos bens provenientes dessas terras.[1] Para consolidar esse direito com base na posse do conhecimento das técnicas que levaram às descobertas,[2] os portugueses mediam a latitude (tarefa astronômica) que era registrada nos mapas formando redes de referências. Daí a importância dos mapas. Também eram implantados in loco marcos, geralmente colunas de pedra encimadas com a cruz para atestar o domínio lusitano. A própria cerimônia ritual da chegada de Cabral estabeleceu o domínio lusitano através da medição e registro da latitude do local de desembarque pelo Mestre João.
Esses direitos, bem como a validade do Tratado de Tordesilhas foram contestados pelos rivais como Inglaterra, França e Holanda. Por isso eles praticaram pirataria para os portugueses, mas não para eles. E qual era o direito aos oceanos? Na Holanda, o contestador foi Hugo Grotius (1583-1645) da cidade de Delft, considerado fundador do moderno Direito Internacional. Ele colocou em discussão a diferença entre mare clausum e mare liberum (todos os oceanos, como sabemos, estão interligados) em sua obra Mare Liberum (1609).