Em 1681, ao chegar ao rio Araguari, o grupo que acompanhava o padre Pfeil na missão cartográfica se deparou com franceses que vinham da Guiana realizar comércio com os indígenas. O rei Luis XIV da França tinha ordenado o marquês de Ferrolles, governador da Guiana Francesa, a expandir a ocupação francesa até o Amazonas. Como estava em vigor a lei de 1680 que concedia liberdade aos indígenas, os missionários pagaram por eles a restituição da liberdade. Mas, admoestaram os franceses de que estavam fora do seu território. O sacerdote que acompanhava Pfeil, usando de sua autoridade enviou uma carta ao provincial dos jesuítas em Caiena, repudiando a presença dos franceses em terras consideradas portuguesas, forma talvez de mandar um recado ao marquês de Ferrolles. Na volta, como marco de posse o grupo de Pfeil ergueu uma cruz na aldeia de Tabarapixi (junto ao rio Araguari), local de que Pfeil gostou e escolheu para ficar futuramente como missionário. Os franceses, por sua vez, tomaram o Forte de Macapá, mas só por poucas semanas porque os portugueses o reconquistaram.
Sendo “homem insigne nas Matemáticas e Fortificações”, Pfeil traçou um mapa, desde o Pará até o Cabo Norte, isto é, até o rio Oiapoque que, para os portugueses, era o mesmo rio que Pinzón teria descoberto em sua viagem de 1500 e denominado Vicente Pinzón, seu próprio nome. Que fossem diferentes nomes do mesmo rio seria posto depois em dúvida pelos franceses, dando lugar a uma disputa sobre a localização da fronteira.[1] O mapa de Pfeil [2] foi levado em 1685 pelo superior da ordem no Maranhão e oferecido a D. Pedro II em Lisboa. Pfeil ainda teria feito um outro mapa cobrindo todo o Estado do Maranhão e Grão-Pará, que fôra enviado para Roma, mas não se sabe do destino de ambos.[3]
Em carta régia de 1686, D. Pedro II pediu ao governador do Maranhão a construção de fortalezas em benefício da posse do território em região de fronteira, da conversão dos gentios que nele habitavam e da prevenção contra a presença dos franceses. No fundo o rei queria que esses índios se tornassem seus súditos.
Em resposta, nesse mesmo ano o governador Gomes Freire de Andrade enviou um engenheiro capitão-mor e o P. Pfeil com mais missionários ao Cabo do Norte, para escolherem um local para a construção de uma fortificação. O lugar escolhido foi às margens do rio Araguari, pois era por ele que os franceses entravam no Amazonas para comerciar com os gentios. O forte foi construído em Torrego (ou Tauregue), que em 1687 foi guarnecido com 25 soldados e três canhões. Seria o mesmo local do forte ocupado por pouco tempo pelos franceses, quando se retiraram na primeira visita do padre Pfeil. Nesse local os piratas ingleses tinham construído o Forte Comaú. Hoje está o magnífico Forte de São José do Macapá, nessa capital.
O capitão e o padre procuraram estabelecer contato com os grupos indígenas, tentando seduzir e cooptar os líderes. Aconselhados pelos próprios índios que conheciam a região, escolheram o local para a missão, onde a caça e a pesca eram abundantes. Aí foram deixados dois missionários jesuítas. O capitão-mor e Pfeil retornaram ao Pará sem deixar soldados, pois os inacianos preferiram que os militares não ficassem para não atrapalhar a catequese. No retorno a Belém, passaram pela aldeia de Tabarapixi, aquele lugar que Pfeil já tinha escolhido para sua futura residência. Logo, com ajuda dos soldados, se edificou ali uma casa.
Os padres que ficaram na missão foram inicialmente aceitos pelos ameríndios. Eles pregavam contra a embriaguez e a poligamia e tentavam por todas as formas mudar práticas culturais, entendendo que catequizar e civilizar andavam juntos. Para sustentar a atividade missionária, esses padres iniciaram a construção da igreja, espaço para a catequese. Mas algo mudou subitamente os planos da Companhia de Jesus para o Cabo Norte.
Em novembro de 1687, o capitão-mor, soldados e o padre Pfeil retornaram à missão para que o último ficasse na aldeia de Tabarapixi, onde exerceria sua atividade. Mas lá foram informados por indígenas da morte dos dois padres, que havia ocorrido em setembro por grupos indígenas que viviam nas proximidades. O capitão-mor imediatamente mandou capturar os ameríndios envolvidos. Eles foram encontrados quando tentavam fugir para a Guiana Francesa. Os indígenas já sabiam das disputas entre os portugueses e os franceses e que, ao passarem ao território francês, os portugueses não poderiam capturá-los. Como os portugueses faziam uma política de terror na conquista e no estabelecimento de fortes, foi comum durante a primeira metade do século 18 grupos ameríndios preferirem viver em missões de jesuítas franceses na região do Oiapoque, safando-se das debandadas provocadas pelos portugueses. Após investigações, a justiça condenou à morte dois envolvidos e outros receberam a pena de degredo no Maranhão. Mas, dois anos depois deu-se anistia geral aos índios que ainda andavam fugidos por esse e outros crimes, provavelmente para evitar que os ameríndios realizassem contatos com os franceses, pois as populações indígenas eram fundamentais para a consolidação do domínio. Assim a missão jesuítica no Cabo Norte fracassou e foi abandonada pelo padre Pfeil em 1697. Em meio a um tratado provisório entre França e Portugal, que teria anulado todos os direitos de Portugal sobre essa região, em 1701 Pfeil foi chamado para voltar urgentemente para Lisboa trazendo todos os mapas e documentos. Infelizmente o navio naufragou perto dos Açores. Pfeil morreu e todos os documentos foram perdidos.[4]
O Tratado de Utrecht (1713) reconheceria a soberania de Portugal sobre as terras entre os rios Amazonas e Oiapoque (atual Amapá). Mas nem isso encerraria a questão.