P. Samuel Fritz (1654-1725)

Em 1689 o padre Fritz começou a descer o Amazonas e, mesmo entrando em área ocupada por portugueses ao longo do rio Solimões, foi implantando missões. Parece que, tendo chegado a Quito em 1685, não teve tempo para se informar da ocupação portuguesa em território espanhol, após a União Ibérica. No meio da viagem o padre Fritz adoeceu e pediu para ser levado para Belém para receber melhores cuidados. Estranhamente ele preferiu seguir doente para Belém, que era mais longe e estava em território inimigo, do que regressar para Quito e se tratar com seus irmãos espanhois. Em Belém, com ajuda do já citado Pfeil, companheiro de Ordem, mas a serviço da coroa portuguesa, Fritz preparou o primeiro mapa detalhado do Solimões (1691) e Amazonas (1707), El gran rio Marañon,[1] que teria sido repassado a La Condamine (ver adiante).

Interrogado sobre sua vinda a Belém, o padre Fritz alegou que era para mapear toda a região do rio Solimões e do rio Amazonas e passar essas informações e mapas para a coroa espanhola. Dando essa resposta, ele foi aprisionado no Colégio dos Jesuítas. Mas em abril de 1691 chegou a autorização de D. Pedro II liberando-o para retornar às suas missões. Ao chegar a Quito e entregar seus mapas, Fritz denunciou ao Vice-Rei do Peru a presença de sertanistas lusos que subiam o rio Solimões e o rio Marañon. Mas a conquista do rio Solimões pelos portugueses logo se consumaria, entre 1709 e 1710.

Fato é que os jesuítas pertenciam todos a uma mesma Ordem, em que uns estavam a serviço da coroa portuguesa, outros, da coroa espanhola. Os interesses ora divergentes entre as coroas, além da interferência das questões temporais nas funções espirituais de missionários, criavam dilemas complicados.[2]

Também é fato que a resistência à invasão lusitana foi só dos jesuítas que trabalhavam para o governo espanhol e pelos índios por eles convertidos em algumas missões como a Maynás no Alto Amazonas (1638), Guaranis (1626) e Sete Povos (1680) no sul, Moxos e Chiquitos na Bolívia (1690); entre parênteses o ano da fundação das missões. Por fim, o próprio rei Carlos III da Espanha (rei de 1759 a 1788) expulsaria a Companhia de Jesus em 1767 da Espanha e suas colônias, selando assim o total abandono da região amazônica.

Portugal, por sua vez, foi favorecido por contar na região amazônica conquistada, com uma rede fluvial que dava acesso, através das bacias amazônica e platina ao Oceano Atlântico e facilitaria a expansão para todas as direções.

Fritz não chegou a ter formação cartográfica como os jesuítas portugueses, mas trabalhou nisso com base na experiência de navegar o Amazonas e medindo latitudes ao longo do rio observando o Sol com um quadrante. No mapa citava aldeias, missões e povos indígenas em todo o seu trajeto. Além de trabalhar como cartógrafo, também desempenhou papel relevante na catequização de vários povos indígenas das várzeas do alto Solimões. Em maio de 1693, ele regressou às suas missões, dando continuidade à catequização e ao enriquecimento de seu mapa, explorando vários afluentes do rio Solimões. Durante todo os seus anos de vida, Fritz se empenhou na proteção dos índios e na luta contra as investidas portuguesas, buscando amigos jesuítas nas províncias portuguesas do Pará e do Maranhão.


Notas
[1] Cortesão, Jaime, A cartografia amazônica durante o século XVII, Terra Brasilis (Nova Série), 14, 1-17, 2020, https://doi.org/10.4000/terrabrasilis.6994. Figura 11. Mapa geographica del rio Marañon e Figura 12. Mapa do rio Amazonas, ambos do padre Fritz.
[2] Herzog, Tamar, Frontiers of Possession. Spain and Portugal in Europe and the Americas, Cambridge, Massachusetts, Harvard University Press, 2015.
https://books.google.com.br/books?id=duqaBQAAQBAJ&lpg=PA78&ots=MASY7afh8M&dq=aloisio%20pfeil&pg=PA75#v=onepage&q&f=false
Oscar T. Matsuura

Oscar T. Matsuura

Oscar T. Matsuura é docente aposentado do Departamento de Astronomia do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas (IAG) da USP, onde liderou o Grupo de Astrofísica do Sistema Solar. Foi diretor do Planetário e Escola Municipal de Astrofísica Prof. Aristóteles Orsini em São Paulo e é pesquisador colaborador do Museu de Astronomia e Ciências Afins (MAST/MCTI). Ultimamente tem se dedicado à História da Astronomia no Brasil.
Oscar T. Matsuura é docente aposentado do Departamento de Astronomia do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas (IAG) da USP, onde liderou o Grupo de Astrofísica do Sistema Solar. Foi diretor do Planetário e Escola Municipal de Astrofísica Prof. Aristóteles Orsini em São Paulo e é pesquisador colaborador do Museu de Astronomia e Ciências Afins (MAST/MCTI). Ultimamente…
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