A região já conta com valiosas iniciativas de IA em questões ambientais e de direitos humanos; no entanto, há preocupação com possíveis manipulações com algoritmos
A invasão da inteligência artificial (IA) carrega o potencial de reestruturar aspectos centrais da vida e do trabalho na América Latina, especialmente em questões de inclusão social, saúde e mudança climática. Com isso em vista, a Argentina recentemente aprovou um dispositivo que busca enfrentar esses desafios de forma “transparente, equitativa e responsável”.
A Subsecretaria de Tecnologias da Informação argentina se baseou na Recomendação da Unesco sobre a Ética da Inteligência Artificial, que afirma que a IA “tem criado muitas oportunidades globalmente, desde facilitar diagnósticos de saúde até possibilitar conexões humanas por meio de redes sociais”, mas também tem gerado grandes preocupações. Entre elas, a coleta de dados para treinar algoritmos em áreas tão sensíveis quanto casos criminais, informações médicas e características pessoais como raça, sexo, idade, religião ou opiniões políticas, muitas vezes usadas “como base para publicidade direcionada e manipulação do comportamento”.
A América Latina e o Caribe detêm apenas 1% das patentes de IA do mundo, revela um relatório do Banco Interamericano de Desenvolvimento e do think tank C Minds. Diante desse panorama, é necessário fortalecer as capacidades regionais e nacionais, deixando para trás um modelo de “autorregulação” que “há muito tempo prioriza objetivos comerciais e geopolíticos sobre as pessoas”, afirma a Unesco. A maior parte desses sistemas nem sequer explicam como chegam aos seus resultados.
Nesse sentido, as Recomendações para uma Inteligência Artificial confiável aprovadas na Argentina propõem um ciclo de implementação que contempla a formação de equipes multidisciplinares, treinamento sobre o funcionamento e implicações da IA e instrumentos de controle para identificar responsabilidades e promover a prestação de contas.
Falta de conhecimento
De acordo com especialistas, a falta de conhecimento sobre como os sistemas de IA podem apresentar riscos aos direitos de privacidade, especialmente em processos que muitas vezes são percebidos como autônomos: empréstimos bancários, cessões governamentais e tratamento de dados pessoais. Na mesma linha, há uma preocupação com a falta de integração das mulheres no desenvolvimento e governança dos sistemas de IA. “Apenas Argentina (com 34%), México (27%) e Brasil (26%) estão entre os primeiros 34 países onde as diferenças de gênero na participação em publicações sobre IA são menos marcantes”, especifica o estudo.
Oportunidades
Apesar das disparidades, não é possível ignorar a oportunidade que esta tecnologia representa, por exemplo, para a gestão dos recursos hídricos: “Há pouca informação sobre os nossos aquíferos. Ao pesquisar e estudar dados climáticos e geológicos, a IA pode nos ajudar a garantir o direito humano à água.” Porém, o pleno aproveitamento dessas tecnologias dependerá de um efetivo alinhamento de todos os players do setor, da formação de talentos locais e da decisão de colocar o ser humano no centro das conversas, diz o relatório. Só assim, conclui, será possível “projetar a voz e a experiência da América Latina” sob princípios éticos inclusivos que contribuam para a prosperidade e a justiça.
Com informações de SciDev.Net