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Se o Brasil não fortalecer suas políticas de Ciência e Educação, se tornará um país vulnerável, apontam especialistas

Na abertura da série de seminários Vozes da Ciência, as presidentes da SBPC, Francilene Garcia, e da ABC, Helena Nader, comentam desafios das políticas públicas, principalmente olhando o cenário eleitoral de 2026.

 

Como garantir que as mudanças políticas que o Brasil enfrentará em 2026, com um novo período eleitoral, encabecem melhorias legislativas e estruturais em Ciência e Educação? Esta foi uma das perguntas norteadoras do primeiro seminário da série “Vozes da Ciência – O Brasil que queremos”, realizado na última sexta-feira, 28 de novembro, pela Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC).

Para responder à questão e refletir sobre o desenvolvimento do País, o evento contou com as falas da presidente da SBPC, Francilene Garcia, e da presidente da Academia Brasileira de Ciências (ABC), Helena Nader, além de um depoimento em vídeo do ex-ministro do Meio Ambiente e da Amazônia Legal (1993-1994) e da Fazenda (1994), Rubens Ricupero.

Antes do início dos debates, a vice-presidente da SBPC e coordenadora do ciclo “Vozes da Ciência – O Brasil que queremos”, Soraya Smaili, explicou a ideia do evento. Ao todo, serão 12 encontros virtuais, sempre às 10h da manhã e sempre transmitidos pelo canal da SBPC no YouTube (www.youtube.com/canalsbpc), que resultarão na produção de documentos propositivos, a serem encaminhados às candidatas e aos candidatos nas eleições de 2026.

“Este ciclo do ‘Vozes da Ciência’ foi pensado para que nós possamos promover reflexões sobre o papel da Ciência na construção da democracia, da soberania e do desenvolvimento humano e social do nosso País. Neste momento que estamos vivendo, é muito importante falarmos do papel estratégico da Ciência. É um debate mais do que atual, é uma necessidade”, ponderou Smaili.

Iniciado na última sexta-feira, o ciclo do Vozes da Ciência seguirá até abril de 2026. “Vamos falar de propostas que precisamos construir para fortalecer não só a Ciência, mas também as políticas públicas baseadas no conhecimento científico que nós tanto produzimos e vamos continuar produzindo no nosso País. Além disso, buscamos contribuir com uma agenda nacional orientada, para que possamos falar de Ciência e Educação e de justiça social num momento em que teremos muitas mudanças, encabeçadas pelo próximo período eleitoral”, continuou a vice-presidente da SBPC.

Mediador da mesa-redonda, o também vice-presidente da SBPC, Aldo Zarbin, ressaltou a importância do evento. “Todos sabemos do papel central que a Ciência deve ter para um país que deseja ser forte, rico, soberano e igualitário. É importante que lembremos aos postulantes das cadeiras dos postos decisórios desse país que a Ciência não pode ser um projeto de governo que muda a cada quatro anos, mas, obrigatoriamente, tem que ser um projeto de nação.”

 

Ciência no centro

Começando os debates, o ex-ministro do governo de Itamar Franco, Rubens Ricupero, argumentou sobre a importância de o conhecimento científico ser centro de construções políticas. “Qual é o lugar que nós desejamos para a ciência num Brasil mais justo, mais próspero, mais equitativo? Eu responderia de uma maneira muito simples. Em poucas palavras, é um Brasil baseado no conhecimento e nas pessoas”

Em sua fala, Ricupero apontou áreas em que o País se destaca, como as pesquisas agropecuárias – com ênfase à atuação da Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária) – e o desenvolvimento de aeronaves, mas que é necessário mais estímulo tecnológico e inovativo.

“Nós precisamos, cada vez mais, desenvolver tecnologias nossas. Não há mal nenhum, é claro, em importar tecnologia, know how e importar pessoas que possam desenvolver esses campos no Brasil. No entanto, o ideal é que o Brasil tenha uma capacidade científica própria, uma capacidade científica que começa no domínio da ciência pura.”

Presidente da ABC, Helena Nader iniciou sua fala argumentando a necessidade de uma mudança de visão de políticos sobre o tema. “É importante todos entendermos que sem Educação e sem Ciência não há futuro.”

Nader destacou mudanças comportamentais positivas do Brasil no início do século XIX, mas que se perderam ao longo dos anos. “Em 2002, o Brasil começou a investir mais do que a China em Ciência, só um pouco a mais, mas era mais. Hoje, a China está onde está, por quê? Com investimento em Educação e Ciência. E ela investe hoje um PIB [Produto Interno Bruto] que é muito maior do que o nosso. O que eu quero dizer é que o Brasil não pode esperar.”

A presidente da ABC também lamentou a decisão da Câmara dos Deputados e do Senado Federal na última semana sobre derrubar vetos do Governo Federal sobre a Lei de Licenciamento Ambiental. “Nós temos um corpo político que está lutando contra o Brasil.”

Outro ponto destacado por Nader foram as políticas da Amazônia, na qual ainda carecem de fomento. Para ela, falta a compreensão da Ciência como prioridade. “No ano passado, o Senado Federal, quando aprovou a Lei Orçamentária Anual (LOA), concordou que orçamentos de Educação e Ciência deveriam estar fora do teto de gastos. Mas a LOA foi para a Câmara dos Deputados e, por disputas políticas, se derrubou isso. Quem ganhou com essa decisão? Eu acho que nem os deputados, muito menos o Brasil.”

presidente da SBPC, Francilene Garcia, ressaltou que o Vozes da Ciência atende a objetivos da entidade firmados desde a sua criação. “A SBPC, desde o seu primeiro momento de existência, vem buscando exatamente ampliar a participação social, de maneira que a Ciência sempre esteja fortalecendo o debate público. Porque Ciência, Educação e Democracia estão e estarão sempre no centro do projeto de País que queremos.”

Garcia apontou que o Brasil defendido pela comunidade científica exige uma Ciência forte, um Estado forte e, mais do que tudo, uma democracia viva. “Não dá para começar a falar sobre esse tema sem olhar para os últimos anos, que nos marcaram profundamente. A tentativa de golpe no dia 8 de janeiro de 2023, ao nosso ver, expôs fragilidades institucionais que jamais a gente vai poder normalizar. Há também as vidas perdidas na pandemia de covid-19 que foram ceifadas, podemos dizer assim, pela desinformação e pelo negacionismo. Elas nos lembram muito fortemente que negar ciência mata e que proteger a vida exige instituições científicas fortes.”

A presidente da SBPC apontou três eixos necessários para o desenvolvimento do País. O primeiro eixo é o da soberania científica e produtiva do País; já o segundo, é a ciência como instrumento de proteção da vida e, sobretudo, na redução das desigualdades. Por fim, o terceiro eixo é a formação de pessoas. “Nós somos fundamentalmente dependentes dos nossos talentos, e nós precisamos trabalhar muito bem esses talentos.”

Outro ponto alertado por Garcia foi sobre a dependência do Brasil de soluções internacionais, principalmente no gerenciamento de seus próprios dados públicos. “Dados e infraestrutura digital é algo que nós precisamos governar. Porque governar dados quer dizer governar o nosso futuro. Então, é preciso que a gente tenha não só a condição de manter centros nacionais de computação avançada, mas também várias infraestruturas públicas de universidades. O Brasil, ainda nesse aspecto, também precisa avançar sobre a inteligência artificial e entender que a inteligência artificial pode contribuir com a justiça social.”

Garcia encerrou sua fala citando que o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) deve entregar a próxima Estratégia Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação nos próximos dias, desenhando as políticas científicas para os próximos cinco anos – e que essa Estratégia precisa ser tocada pelo Governo Federal. “Porque o Brasil, sem Ciência, é um Brasil vulnerável. E continuará sendo sempre vulnerável”, concluiu.

A primeira sessão do Vozes da Ciência, com o tema “O Lugar da Ciência no Brasil que Queremos – Democracia e Soberania Sempre”, está disponível na íntegra no canal da SBPC no YouTube.

Rafael Revadam – Jornal da Ciência

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