Ciência no dia a dia
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A física da televisão – e do streaming

De tubos de raios catódicos a plataformas digitais, a ciência que moldou a forma como vemos o mundo

 

A televisão foi, sem dúvida, um dos maiores símbolos do século XX. Mais do que um meio de comunicação, ela transformou hábitos, moldou culturas e redefiniu a maneira como a sociedade consome informação e entretenimento. Hoje, na era do streaming, a tela que antes reunia famílias ao redor de transmissões abertas se reinventou em smartphones, notebooks e smart TVs, movida por descobertas científicas que vão do eletromagnetismo à física dos semicondutores.

O nascimento da imagem em movimento

Os primeiros televisores, conhecidos como CRTs (tubos de raios catódicos), nasceram da aplicação direta da física do eletromagnetismo e da luminiscência. O princípio era engenhoso: um feixe de elétrons disparado na parte traseira do aparelho era acelerado por diferença de potencial e desviado por campos magnéticos, percorrendo a tela em alta velocidade. Cada ponto atingido no revestimento de fósforo emitia luz, compondo, pixel a pixel, a imagem que os olhos humanos percebiam como contínua. (Figura 1)

Figura 1. RCA 630-TS foi o primeiro televisor eletrônico de produção em larga escala, comercializado entre 1946 e 1947.
(Fonte: Divulgação)

 

 

Nos modelos em preto e branco, um único feixe de elétrons bastava. Já nas televisões coloridas, três canhões – vermelho, verde e azul – criavam o espectro completo de cores. Esse sistema funcionou como base tecnológica por décadas, até o boom comercial da televisão nos anos 1950, quando milhões de lares na Europa, nos Estados Unidos e, pouco depois, no Brasil, foram tomados por aparelhos pesados, de telas pequenas e imagens cintilantes.

Do fósforo ao cristal líquido

Com o avanço da ciência dos materiais, os CRTs começaram a dar lugar a tecnologias mais leves e de maior definição. Telas de cristal líquido (LCDs) passaram a utilizar a interação da luz de fundo com moléculas de cristal líquido polarizadas por campos elétricos. LEDs e, mais tarde, painéis de plasma refinaram a qualidade da cor e do contraste. Já a tecnologia OLED marcou um salto: cada pixel passou a emitir sua própria luz, dispensando iluminação traseira e permitindo televisores ultrafinos, com cores vibrantes e ângulos de visão ampliados.

 

“Cada salto tecnológico das telas foi impulsionado pela ciência dos materiais e dos semicondutores.”

 

Cada uma dessas evoluções só foi possível graças ao acúmulo de conhecimento em física da matéria condensada e semicondutores – áreas que estudam desde a interação de elétrons em materiais sólidos até o comportamento de novos compostos capazes de transformar eletricidade em luz.

O caminho do sinal: do ar à fibra óptica

Se a tela é a face visível da televisão, a transmissão dos sinais é o coração invisível do sistema. No início, ondas eletromagnéticas captadas por antenas traziam imagem e som. O salto para a transmissão digital, consolidado no Brasil a partir dos anos 2000, ampliou a qualidade e a estabilidade do sinal. Hoje, boa parte dos dados viaja por cabos coaxiais e, principalmente, por fibras ópticas – onde pulsos de luz percorrem longas distâncias graças ao fenômeno da reflexão interna total.

Nas transmissões sem fio, como Wi-Fi e 5G, entram em cena as ondas de rádio, regidas pelas leis do eletromagnetismo. Em ambos os casos, a física garante que bilhões de bits por segundo atravessem continentes e cheguem a telas domésticas quase em tempo real.

Do broadcast ao streaming: a revolução invisível

O streaming levou a televisão a um novo patamar. Filmes, séries e transmissões ao vivo já não dependem de horários fixos ou antenas direcionadas: agora viajam pela internet. Mas por trás da aparente simplicidade de “dar play”, há uma cadeia complexa de processos físicos e matemáticos. (Figura 2)

Figura 2. O streaming transformou a forma como consumimos conteúdo, mudando a indústria do entretenimento ao popularizar o acesso sob demanda a filmes, séries e músicas pela internet
(Foto: Freepik. Reprodução)

 

Primeiro, o conteúdo é convertido de sinal analógico em digital, apoiado na eletrônica dos semicondutores. Em seguida, passa por algoritmos de compressão, que reduzem o tamanho dos arquivos eliminando redundâncias imperceptíveis ao olho humano. Esse material compactado é armazenado em data centers – verdadeiras “usinas digitais” refrigeradas e alimentadas por energia constante.

Para garantir agilidade, as plataformas utilizam redes de distribuição de conteúdo (CDNs), replicando os arquivos em servidores espalhados pelo mundo. Quando alguém acessa uma série, o sistema envia os dados a partir do ponto mais próximo geograficamente, reduzindo atrasos. No percurso, cabos de fibra óptica e sinais de rádio transportam o conteúdo em velocidades próximas à da luz.

 

“O streaming transformou a TV de palco coletivo em experiência personalizada, mas sempre movida pela mesma base científica.”

 

Por fim, na casa do usuário, a eletrônica do aparelho descompacta os dados, reconvertendo-os em sinais de luz e som. O buffer (armazenamento temporário) garante que o vídeo continue mesmo com oscilações da internet, enquanto a adaptação de bitrate ajusta automaticamente a qualidade da imagem conforme a velocidade da conexão.

Do sofá ao bolso

Se a televisão foi o grande palco coletivo do século XX, o streaming a transformou em experiência personalizada. Agora, cada pessoa carrega no bolso um dispositivo capaz de acessar milhares de horas de conteúdo sob demanda, com resolução 4K ou 8K, som imersivo e inteligência artificial sugerindo o próximo episódio.

Mas, no fundo, tudo se sustenta na mesma base: a física. Do feixe de elétrons nos velhos CRTs aos pulsos de luz que correm pelas fibras ópticas globais, a ciência continua sendo a engrenagem invisível por trás daquilo que chamamos de maratona de séries.

 

Capa. Freepik. Reprodução

 

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